Sofística
(uma biografia do conhecimento)
115 – Metáfora - definição e paradoxo.
É Barbara Cassin quem diz:
“A fim de melhor explicitar essa clareza original da metáfora, convém retomar a questão a partir da definição canônica dada pela Poética: "A metáfora é a aplicação de um nome impróprio (ti(jmatos allotríou epiphorá) por deslocamento, seja do gênero a espécie, seja da espécie ao gênero, seja da espécie à espécie, seja segundo uma relação de analogia". (…) Essa é exatamente a virtude das analogias, que são, entre todas as metáforas, "as mais reputadas" (Ret., 141als.).
(…)
Bem antes de Aristóteles, é a sofística que elabora a primeira retórica: "Górgias foi o primeiro a dar ao gênero retórico força educativa e sua técnica de expressão, utilizou tropos, metáforas, alegorias, hipálages, catacreses, hipérbatos, repetições, retomadas, reviravoltas e correspondências sonoras" (Suidas = JICA2 D.K., II, p. 272, 28-31). Mesmo se o testemunho é tardio, e certo que essa retórica siciliana, que utiliza não somente as figuras de sentido mas joga com os próprios significantes, é uma trópica generalizada, para a qual a metáfora só representa um tropo dentre muitos outros.
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A conclusão da Poética sobre a metáfora reúne todos esses traços: "O mais importante, de longe, é saber fazer metáforas; pois só isso não pode ser retomado de um outro e é o signo de uma natureza bem-dotada. Fazer bem as metáforas é ver o semelhante" (22, 1059a 5-9).
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Aristóteles precisa (…) o sentido dessa expressão: "Digo que as palavras colocam diante dos olhos as coisas a cada vez que elas as significam em ato" (hósa energoúnta semaínei, 1411b24s.). Os exemplos mais extremos são tirados de Homero, que diz em ato não somente os seres animados, mas chega a animar o próprio inanimado: “'as vagas abauladas, galhadas de espuma, umas à frente, outras atrás'” — essas palavras transformam tudo em movimento e em vida, e o movimento é o ato" (141a9s.). Já que a enérgeia, o "ato", é, como nos ensinam a Metafísica e a Física, o que há de mais ente para Aristóteles, ao mesmo tempo ser do ente e ente por excelência, deus mesmo, é preciso convir que a metáfora, em sua melhor forma, faz ver as coisas em seu máximo de ser, faz com que se assemelhem ao que são.” (Fonte: Ensaios Sofísticos, Barbara Cassin, Tradução de Ana Lúcia de Oliveira e Lúcia Cláudia Leão, Edições Siciliano, São Paulo, 1990, p. 241, 242, 243).
Metáfora – paradoxo.
“Um dos paradoxos da fenomenologia prende-se ao fato de que seu discurso, impregnado pela metáfora do visível e da luz, deva entretanto ser não metafórico.” (Fonte: Ensaios Sofísticos, Barbara Cassin, Tradução de Ana Lúcia de Oliveira e Lúcia Cláudia Leão, Edições Siciliano, São Paulo, 1990, p. 239).