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POESIA: deleite-se ou delete-me (09.11.12)

 


Caraos todaos,

 

Sextinha a ser transformada em sextona!

 

Vejam que imagens bacanas:

hamburguer

e,

 

cérebro2

e,

Paixaoadiferenca

(Beto e Gabi forneceram as imagens acima. Obrigado a eles por saberem da minha paixão pelos livros. Mudei o título da última foto para: "paixão e diferença").

Eu não fico devastado quando vejo alguém feliz! Na verdade até busco contribuir para a felicidade dos demais.

 

Vejam o texto abaixo que trata de um assunto muito nosso, “umano”, a inveja. É muito interessante e parece que foi escrito para mim. Só não foi por eu costumar “tirar a gordura da picanha”, no mais, é a mão e a luva, a cachaça e o caju etc.

 

Pratiquemos a “desinveja” e o dia ficará mais melhor que bom!

 

Abraços,

 

Osório

 

Vejam que desaforo (tanto no encaminhamento quanto na beleza da obra):

 

Grande Osório. Segue um soneto que eu fiz. Quando não tiver nada o que postar no deleite-se ou delete-me, pode usá-lo.

 

Como um urso selvagem dilacerando um salmão,

Uma neoplasia malígna corroendo um órgão humano,

A traição e a vaidade envolvendo o leviano,

A saudade faz o mesmo com meu coração.

 

Como uma fêmea infame destrói um feto em formação,

Uma nação néscia elege um líder insano,

A seca extingue os sonhos de um paraíbano,

A saudade faz o mesmo com meu coração.

 

Nasci nostomaníaco. Amo o que já foi extinto,

Envolto ao passado, atônito pressinto,

Que colei saudade em mim, como um emblema,

 

Meu saudosismo é de tal intensidade,

Que daqui a pouco sentirei saudade,

Deste momento em que escrevo este poema.”

 

Autor: Luiz Gonzaga leite Fonseca.

 

e,

 

Janela sobre o espelho

Escorre o sol e leva os restos de sombra deixados pela noite.
As carroças puxadas por cavalos recolhem, de porta em porta, o lixo.
No ar, a aranha estende seus fios de baba.
Parafuso caminha pelas ruas de Melo. Na aldeia, é tido por louco. Ele leva um espelho na mão e se olha com expressão fechada. Não desgruda os olhos do espelho.
- O que você está fazendo, Parafuso?
- Estou aqui - responde. - Controlando o inimigo.”

 

Autor: Eduardo Galeano, As palavras andantes, LPM, p. 205.

 

e,

 

Inveja

 

Você não fica devastado quando vê alguém feliz, que diz que gosta de si mesmo, não se arrepende de nada, entende o mundo e o sentido da vida, não fica desgraçadamente arrasado quando escuta que alguém é casado com a namorada da faculdade e é suuuuper feliz, foi fiel durante décadas, tem a vida sexual como as de alguns personagens mitológicos, que chegou a ter um caso no vigésimo ano de casado, mas foi perdoado e amado como nunca, você não entra em pânico quando descobre que um amigo comprou móveis na baixa que hoje valem 20 vezes mais, ações na baixa que vendeu antes da crise dos derivativos, que aplicou numa empresa chamada Apple quando ainda se usavam máquinas de escrever, que herdou uma fattoria à beira do mar na ponta da Bota, de um tio italiano gay que foi o único a ficar na terrinha, não emigrar e que não teve filhos, em que se colhem trufas brancas, que milagrosamente nascem ali, e produz um vinho premiado por toda a Europa, não se choca quando sabe que alguém foi promovido e passou a ganhar benefícios como cartão corporativo, plano de saúde com helicóptero, carro do ano, secretária e sala com vista, ou que tem gente que não precisa estudar para passar de ano porque basta prestar atenção, ou que tem facilidade com línguas e fala entre outras russo correntemente, entrou no vestibular sem cursinho, dorme como uma pedra, nunca toma remédios na vida nem nunca fica doente, tem colesterol, glicemia, pressão e batimentos cardíacos abaixo dos alertas, vai ao banheiro duas vezes ao dia, não engorda, nem se jantasse pizza com borda recheada todas as noites, pois tem um bom metabolismo, fuma eventualmente um cigarro a cada dois meses e nunca extrapola esse cálculo, não tem cálculos renais, nem na vesícula, gordura no fígado, artroses, bursites, tendinites, joga tênis com a galera mais jovem do clube, porque sempre ganha dos tiozinhos da sua idade, tem um cachorro que não late para visitas, nem tem pulgas, mas ataca todos os gatunos que se aventuraram por seu bairro, que a casa em que mora nunca foi assaltada, a única da rua que nunca foi, que não tem rugas, cabelos brancos, cera de ouvido, caspa, calos, pele oleosa, unhas encravadas, joelhos tortos, pé chato, pernas em xis, joanete, flatulência, hérnia de disco, herpes, mau hálito, incontinência, enxerga sem óculos - nada de miopia, estrabismo ou estigmatismo -, lê bulas de remédio, menus de restaurantes praianos especialistas em luaus iluminados por tochas, partidas e chegadas de aviões, placas nas estradas, comprou casualmente quadros de pintores brasileiros iniciantes que hoje estão expostos alguns na Tate e outros no MoMA, costuma ser convidado para dar palestras motivacionais no Caribe, Ilhas Fiji, Bali, Ilhas Maurício, Córsega, que comprou um apezinho no Marrais quando o euro não valia nada, entrou de sócio numa fábrica coreana de carros e numa fazenda de produtos orgânicos, leu Ulisses na escola, Proust no original, quando terminou o curso de francês e se envolveu com seu caso extraconjugal parisiense, toda obra de Balzac, A Divina Comédia, exemplar raríssimo que encontrou empoeirado na sede da fattoria que herdou aparentemente autografado pelo autor, Os Irmãos Karamazov, para praticar o russo, quando entrou de sócio de uma petrolífera com um ex-agente da KGB, que hoje tem um time de futebol no Reino Unido e partes de uma equipe de Fórmula 1, que se tornou seu melhor amigo e é credenciado pela Fifa e Uefa a frequentar estádios da Copa do Mundo e da Liga de Campeões da Europa, na tribuna dos dirigentes máximos da entidade, e sempre sobra convites, você não fica absurdamente destroçado quando tem alguém com bom senso para não entrar em brigas de trânsito, que dá passagem, que jamais para em vagas de idosos e deficientes, que acena para ajudar apressados na ultrapassagem, que não se importa quando o motorista de trás aciona a buzina assim que o farol de trânsito muda do vermelho para o verde, que nunca foi multado - e nas três vezes em que foi parado na blitz do bafômetro tinha bebido suco de tomate, porque tivera um mau pressentimento -, que não se estressa quando vê alguém furando a fila do cinema e simplesmente indica outro caixa livre, que salga a pipoca como se cálcio em excesso fizesse bem para a circulação, que tolera frutose, glicose e glúten, não tira a fatia de gordura da picanha, que não se importa com a turma de garotos que erraram de filme e, num denso drama argentino, comenta a baladinha da noite anterior e marca o ponto de encontro da baladinha posterior, moços e moças que chacoalham sacos de pipocas para misturar o sal como se estivessem na ala de chocalhos da bateria de uma escola de samba do primeiro grupo, que não colocam celulares no silencioso e que, ultimamente, você neurótico reparou, as telas touchscreen dos celulares e tablets estão mais luminosas, porque nós, estressados, não aguentamos filme fora de foco, ar-condicionado glacial em salas de cinema e teatro, atores que cospem uns nos outros enquanto representam, muito menos o barulho de um saquinho de delicado ou jujuba aberto, mas fica arruinado quando encontra alguém que saiba configurar computadores em diferentes sistemas operacionais, até aquele gratuito, que entende tudo de formulário da Receita Federal e está em dia com ela, com o Estado e a prefeitura, com o condomínio e o da casa de praia, que consegue tuitar e responder a e-mails ao mesmo tempo, tem Face Book, Instagram, G+, Linkedin, What’s Up, as últimas versões dos aplicativos essenciais atualizados, você não inveja absolutamente aquele que não tem cáries, canais, implantes, dentes amarelados, que nunca ouviram que seria melhor consultar um ortodontista, ou que escutaram "quando casar passa", e passou? Relaxa.

 

A boa notícia, e que nos dá um enorme consolo, é que essa pessoa não existe. E a baixa filosofia ensina: se existisse, não teria a sensação inigualável e prazerosa de aprender com os erros.

 

Como dizem os invejosos, errar é humano, e a perfeição não existe.

 

Autor: MARCELO RUBENS PAIVA.

 

Fonte: Estadão de 03 de novembro de 2012.

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