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APELAÇÃO EMMANDADODESEGURANÇA
AUTOSn.º0003310-08.2012.4.03.6100
APELANTES: MORGANA LAMEIRÃO LIMA E OUTROS
APELADA: UNIÃO (FAZENDA NACIONAL)
RELATORA:JUÍZA MARLI FERREIRA – QUARTA TURMA
PARECER
COLENDA TURMA,
NOBRE RELATORA:
Objeto: declaração da ilegalidade da cobrança do imposto de renda sobre ganho de capital auferido na alienação de participação societária adquirida em 1985 e mantida por mais de cinco anos, a fim de se garantir a aplicação da isenção de que trata o artigo 4º, alínea d, do Decreto-lei nº 1.510/76 (fls. 02/15).
Informações: fls. 365/381.
Parecerministerial(1ºGrau):pela ausência de interesse público primário (fls. 413/414).
Resultado: denegou a segurança (fls. 416/420).
Apelaçãodosimpetrantes:fls. 430/443.
Contrarrazões:fls. 462/465.
Relatado. Opina.
A discussão refere-se à isenção concedida aos contribuintes pelo art. 4º, d, do Decreto-Lei 1.510/76:
"Art4ºNãoincidiráoimpostodequetrataoartigo1º:
(...)
d)nasalienaçõesefetivadasapósdecorridooperíododecincoanosdadatadasubscriçãoouaquisiçãodaparticipação."
Contudo a Lei nº 7.713, de 22.12.1988, em seu art. 58, revogou a isenção anteriormente concedida. Confira-se:
"Art.58.Revogam-seoart.50daLeinº4.862,de29denovembrode1965,osarts.arts.1ºa9ºdoDecreto-Leinº1.510,de27dedezembrode1976,ose66doDecreto-Leinº1.598,de26dedezembrode1977,osarts.1ºa4ºdoDecreto-Leinº1.641,de7dedezembrode1978,osarts.12e13doDecreto-Leinº1.950,de14dejulhode1982,osarts.15e100daLeinº7.450,de23dedezembrode1985,oart.18doDecreto-Leinº2.287,de23dejulhode1986,oitemIVeoparágrafoúnicodoart.12doDecreto-Leinº2.292,de21denovembrode1986,oitemIIIdoart.2ºdoDecreto-Leinº2.301,de21denovembrode1986,oitemIIIdoart.7ºdoDecreto-Leinº2.394,de21dedezembrode1987,edemaisdisposiçõesemcontrário."(g.n).
Com a revogação do referido Decreto-Lei pela Lei n.º 7.713/88, surgiu a seguinte indagação: A isenção do artigo 4º, alínea "d" do Decreto-Lei n.º 1.510/76, havia sido concedida por prazo certo e sob determinada condição?
A resposta à referida indagação é de suma importância tendo em vista que o artigo 178 do Código Tributário Nacional prescreve que as isenções podem ser revogadas ou modificadas desde que observado o princípio da anterioridade. Entretanto, o mesmo artigo, veda a possibilidade de revogação quando a isenção tenha sido concedida por prazo certo e sob determinadas condições, veja-se:
"Art.178-Aisenção,salvoseconcedidaporprazocertoeemfunçãodedeterminadascondições,podeserrevogadaoumodificadaporlei,aqualquertempo,observadoodispostonoincisoIIIdoart.104."(g.n.).
Insurgem-se os impetrantes sob o fundamento de que a aludida isenção teria se dado sob condição onerosa, não podendo ser livremente suprimida, nos termos do que dispõe o art. 178 do CTN, bem como a Súmula 544 do STF.
Pois bem, não resta qualquer controvérsia de que tal isenção seja efetivamente onerosa. Neste sentido:
"TRIBUTÁRIO.IMPOSTODERENDA.ALIENAÇÃODEAÇÕESSOCIETÁRIAS.ISENÇÃOCONDICIONADAOUONEROSA.DECRETO-LEIN.1.510/76.REVOGAÇÃOPELALEIN.7.713/88.DIREITOADQUIRIDOÀISENÇÃO.IMPOSSIBILIDADEDEREVOGAÇÃO.SÚMULAN.544/STF.1.Insere-senoconceitodeisençãocondicionadaouonerosaaisençãodoimpostoderendasobrelucroauferidoporpessoafísicaemvirtudedevendadeações(art.4º,"d"doDecreto-Lein.1.510/76),poisconcedidamedianteocumprimentodedeterminadorequisito(condição),qualseja,odeaalienaçãoocorrersomentedepoisdedecorridoscincoanosdasubscriçãooudaaquisiçãodaparticipaçãosocietária.2.Cumpridososrequisitosparaogozodaisençãocondicionada,temocontribuintedireitoadquiridoaobenefíciofiscal.3."Isençõestributáriasconcedidas,sobcondiçãoonerosa,nãopodemserlivrementesuprimidas"(Súmulan.544/STF).4.Recursoespecialnão-provido."(REsp656222/RS;RecursoEspecial2004/0107325-9;relator:MinistroJoãoOtáviodeNoronha;datadapublicação/fonte:21/11/2005;órgãojulgador:t2-segundaturma)
Porém, será possível concluir que tal isenção também preencheria o requisito “por prazo certo”? Entende-se que não.
Conforme lição do insigne jurista Hugo de Brito Machado1:
“Umaquestãogeralmentenãoabordadaemrelaçãoàrevogabilidadedasleisqueestabelecemisençõeséadesaberseosrequisitosdoprazodeterminadoedascondiçõesonerosassãoalternativosoucumulativos.
Oart.178doCódigoTributárioNacional,emsuasredaçãooriginária,estabeleciaqueaisenção,salvoseconcedidaporprazocertoouemfunçãodedeterminadascondições,podeserrevogadaoumodificadaporlei,aqualquertempo,observadooprincípiodaanterioridadedaleitributáriaprevistonoart.104domesmoCódigo.Aressalvaquantoàrevogabilidadedasisençõesdiziarespeito,portanto,àquelasconcedidasporprazocertoeemfunçãodedeterminadascondições.ALeiComplementarnº24,de7dejaneirode1975,deunovaredaçãoaoart.178doCódigoTributárioNacional,substituindoadisjuntivaoupelacopulativae.Aesserespeitomanifestou-seAliomarBaleeir,afirmando:
'Aprimitivaredaçãodoart.178eraalternativa:porprazocertoouemfunçãodedeterminadascondições.Umacoisaouaoutra.ALeiComplementarnº24/1975substituiuoupore:ambasascircunstânciassimultaneamente.'
(...)
Sealeiconcedeisençãopordeterminadoprazo,semexigircomprovaçãofuturadecondiçõescujoatendimentosónofuturopodeocorrer,comcertezahaveráairrevogabilidade.Se,porém,aleiestabelececondiçõescujoatendimentosónofuturopodeocorrer,aindaqueestabelecidoumprazodevigênciadanormaisentiva,evidentementepoderáserrevogadaapartirdequandodeixeointeressadodecomprovarascondiçõesmedianteasquaisobteveaisenção.”
Portanto, os requisitos do art. 178 do CTN são cumulativos, e tão somente por meio dessa exegese será considerada irrevogável a isenção sob testilha. Ora, seria deveras pueril pensar-se que existem vocábulos inúteis na lei!
Neste diapasão, afigura-se plenamente possível a revogação da isenção em comento, enquadrando-se na previsão contida na segunda parte do artigo 178, do CTN, porque não restou configurado o atendimento dos dois requisitos, quais sejam, a existência de "prazocerto"e "emfunçãodedeterminadascondições".De fato, o art. 4º, d, do Decreto-Lei nº 1.510/76 fixa o termo inicial do benefício fiscal (após cinco anos da data da subscrição ou aquisição da participação), não determinando o termo final, ou seja, é isenção por prazo indeterminado, revogável, portanto, por lei posterior.
Destarte, não basta que a condição seja onerosa, mas também deve ser por prazo certo, determinado. Uma visão caolha do art. 178, do CTN não se coaduna com o atual Sistema Tributário e princípios que o norteiam. Neste passo, não se pode admitir uma isenção eterna, dado que a própria lei não a permite, e para isto se afigura medida de rigor a observância dos dois requisitos, e não apenas um deles.
Ao admitir-se tal isenção por prazo indeterminado, sem a possibilidade de que seja revogável, estaríamos ofendendo a lógica do sistema financeiro e tributário, bem como as atuais políticas arrecadatórias e de responsabilidade fiscal.
Diante de tais assertivas, é forçoso reconhecer que cai por terra, outrossim, a alegação dos impetrantes de que aludida isenção seria um direito adquirido, e, portanto, insuscetível de revogação.
Ademais, em aresto datado de 11/09/2007, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça, Segunda Turma, no Resp. nº 960.777 - RS (2007/0136212-7), relatado pelo Ministro Herman Benjamin, manifestou-se em caso similar ao destes autos:
TRIBUTÁRIO.IMPOSTODERENDA.ALIENAÇÃODEAÇÕESSOCIETÁRIAS.DECRETO-LEI1.510/76.ISENÇÃO.REQUISITOSPARAIRREVOGABILIDADE.ART.178,DOCTN.NÃOOCORRÊNCIA.LEI7.713/88.REVOGAÇÃO.POSSIBILIDADE.
1. Hipótese em que o Tribunal a quo manteve a sentença de primeiro grau, que julgou procedente o pedido de declaração de inexistência de relação jurídico-tributária, bem como de restituição dos valores pagos, sob o entendimento de que foi implementada a condição imposta no artigo 4º, "d", do Decreto-Lei 1.510/76.
2.Airrevogabilidadedaisençãoconcedida,nostermosdoart.178,doCTN,sóocorreráseatendidososrequisitosdeprazocertoecondiçõesdeterminadas.
Precedentes.Situaçãonãoconfiguradanosautos.
3.ComoadventodaLei7.713/88operou-searevogaçãodareferidaisenção.
4.RecursoEspecialprovido.(g.n.)
Com efeito, verifica-se a clara mudança no entendimento do STJ, a fim de se interpretar o art. 178 do CTN em sua completude. Desta feita a r. sentença proferida em sede de primeiro grau merece manutenção.
Diante do exposto, opina o Ministério Público Federal pelo desprovimentodo apelo dos impetrantes.
São Paulo, 12 de junho de 2013.
OSÓRIO BARBOSA
PROCURADORREGIONALDAREPÚBLICA
1Comentáriosaocódigotributárionacional,vol.III - Hugo de Brito Machado ––, São Paulo: Atlas, 2005, p. 614/615.