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Segunda Carta a Fernanda

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Enquanto eu tiver perguntas e não houver respostas, continuarei a escrever.” (Autora: Clarice Lispector).

 

Menina,

 

 

Espero que a carta anterior tenha sido de alguma valia para você, mas não precisa perder seu precioso tempo me dizendo nada sobre ela, pois, se foi de alguma valia, cumpriu se objetivo, se não estarei tentando melhorar o que lá deixei dito, embora de forma obscura, incompreensível.

 

Você viu a frase da Clarice Lispector acima? Não me responda com um: claro, bobo, está posta no início, como não iria vê-la e lê-la?, pois você teria razão apenas em parte, pois o que eu estou perguntando é: parou para pensar sobre o que a autora diz?

 

Veja o que o crítico de arte e estudioso de costumes inglês Clive Bell diz em seu livro “Civilization:

 

"Somente a razão pode convencer-nos – diz ele – das três verdades fundamentais que é preciso descobrir na vida, e sem as quais não existe a verdadeira liberdade: a de que aquilo em que acreditamos não é necessariamente verdadeiro, a de que aquilo de que gostamos não é necessariamente bom e a de que todas as questões devem permanecer abertas" (citado por Luiz Carlos Lisboa, “A arte de desaprender”, Antares, Rio de Janeiro: 1981, p. 163-165).

 

Se lembrar de alguma coisa que tenha lido na carta anterior, verá que a escritora continuará, pelo jeito, escrevendo por muitos e muitos anos, pois respostas não temos nenhuma para nada.

 

Sendo você curiosa como é, já reparou no seguinte:

 

a) Os três Mosqueteiros são quatro?

 

O livro os "Os Três Mosqueteiros" é de autoria de Alexandre Dumas. Já foi filmado mais de uma vez, sempre está sendo reprisado na sessão da tarde. Seus protagonistas são: "Athos, Porthos e Aramis"... e D'Artagnan. Daí os 3 serem 4!

 

b) Fala-se muito nos “Sete Sábios da Grécia”, mas para muitos eles são oito!

 

Platão, no seu livro “Protágoras”, diz que o grupo é constituído por:

 

1 – Tales de Mileto;

 

2 – Pítaco de Mitelene;

 

3 – Bias de Priene;

 

4 – Sólon de Atenas;

 

5 – Cleobulo de Lindos;

 

6 – Míson de Queneia;

 

7 – Quílon de Lacedemônia.

 

Mas tem gente que cita um oitavo (8): Periandro de Corinto.

 

Tem mais um montão de coisas sobre as quais as pessoas não se entendem!

 

Isso foi dito apenas para que você perceba, mais ainda, que “umas pessoas dizem que é assim, outras dizem que é assado”. Será que o que estou tentando te dizer é certo ou é errado?

 

Desconfie sempre!

 

Mas vamos continuar tentando encontrá-las, pois aí está a beleza da busca do e pelo conhecimento.

 

Lá por volta do Século VI, na Grécia, pelo menos é isso que ficou registrado na forma escrita, que ainda é a melhor maneira de preservar e transmitir conhecimento, apareceu um bando de “malucos” que passou a não se contentar com as explicações que eram dadas para as coisas, para os acontecimentos, e passou a investigar, como fazem os detetives e investigadores modernos de crimes e outras coisas que queremos saber.

 

Assim, esses maluquinhos passaram a desconfiar, por exemplo, daqueles que diziam que os trovões eram sinais sonoros brigas entre os deuses e os raios eram armas dos brigões.

 

Na Grécia se inventou (e o pensamento é pródigo [tem grande capacidade] em inventar as coisas mais absurdas, também) que existia um local onde moravam os deuses gregos, era o Olimpo, exatamente o cume de uma montanha que tinha esse nome: monte Olimpo. Nesse lugar habitavam: Zeus, Hera, Atená, Hermes, Hefesto e muitos outros deuses, sobre os quais, falaremos depois.

 

Foram esses deuses que fizeram as coisas (ou as faziam) e deram (davam) aos homulheres.

 

Só que ninguém nunca viu um deus, menos ainda fazendo alguma coisa. Apenas se acreditava nisso.

 

Então, aqueles “desmiolados” passaram a não aceitar essa explicação, pois era muito fácil e dependia de se ter fé, e não de encontrar uma explicação a ser dada pelo próprio utilizando sua própria razão. Razão que o levaria a descobrir as coisas depois de árdua investigação.

 

As chuvas, por exemplo, não era um deus fazendo pipi. Era a água que se evaporava pelo calor, se condensava e depois se resfriava e voltava a cair.

 

Desmiolados” nada! Eles é que tinham miolos (como se costuma chamar o cérebro) e passaram a usá-los em seus estudos investigatórios.

 

Esses primeiros investigadores amavam estudar, amavam saber das coisas, e esse seu “amor pela sabedoria” veio a dar nome a eles e aos outros homulheres que vieram depois deles e que também tinham e têm o mesmo amor pelo saber. Foram eles e são os que assim procedem chamados de “filósofos”.

 

Em Maraã eu nunca li um livro de Filosofia, infelizmente.

 

Só tomei conhecimento da filosofia por volta dos 17 (dezessete) anos, quando comecei, por conta própria a estudar (e as pessoas que estudam por conta própria são chamadas de autodidata) um filósofo francês de nome Voltaire (se pronuncia “Volter”, mas eu pronunciava como está escrito mesmo, usando o TAIRE do final. Como fui corrigido quando era ainda muito novo, fiquei envergonhado, com o que, hoje, não me envergonho mais, pois descobri que ninguém sabe tudo, e quem nos corrige hoje, certamente será corrigido amanhã. Embora muitos tenham vergonha de admitir que não sabem, especialmente aqueles que vendem a imagem de que sabem tudo, como são os advogados, classe a qual pertenço, e os jornalistas, por exemplo).

 

Gostava do que ele escrevia em seu “Dicionário Filosófico”, a época um livrinho de bolso de qualidade ratuína, publicado pela Ediouro. Ele diz, dentre outras coisas, o seguinte:

 

A dúvida, não é um excelente estado, mas a certeza é ridícula”.

 

Para os donos da verdade, ler isso, deve causar-lhe urticária (a famosa coceira), pois é como um soco em suas vaidades de enganar os demais dizendo que sabem de alguma coisa.

 

Li outros livrinhos (livrinhos pelo tamanho, não pelo conteúdo, pois pelo conteúdo, todo e qualquer livro, é grande) de outros autores pela mesma editora (eram mais baratos, e somente os mais baratos eu podia comprar).

 

Durante o segundo grau e a Faculdade tinha pouco tempo para me dedicar ao estudo da Filosofia, e acabei lendo muito menos do que eu podia (confesso essa falta gravíssima) e devia.

 

O tempo que passei assistindo novelas, deveria, “se soubesse o que sei agora”, ter me dedicado à leitura filosófica.

 

Já trabalhando como promotor de Justiça e depois procurador da República acabei tendo mais tempo, ou usando melhor o tempo que me sobrava, para ler os filósofos.

 

Quando vim para São Paulo fazer mestrado em “Direito Constitucional” na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, a famosa PUC-SP, descobri que “tudo acaba em filosofia”! Embora já tivesse tido essa impressão bem antes.

 

Um matemático, por exemplo, sabe que dois mais dois são quatro (2 + 2 = 4). Ou físico que a menor distância entre dois pontos é uma reta (dizem os livros de iniciantes nessas matérias).

 

Vem o filósofo e enrola o matemático e o físico (deixa ambos sem saberem responder) ao perguntar-lhes “o que é o número?” ou “o que é um ponto?”.

 

Como responder a essas perguntas não se preocupam nem a matemática nem a física, mas é, justamente aí, que o filósofo entra em cena e amarra seu barco para procurar respostas para isso.

 

Um parênteses, Fernanda: sabes por que meus filhos não têm tido muita dificuldade em matemática e física, que muita criança costuma não gostar? Por eu lhes ter estimulado a aprender (decorar mesmo) a tabuada. Isso é fundamental na vida escolar, embora uns e outros por aí digam o contrário, mas nunca estão lá para amparar nas dificuldades e nas reprovações.

 

Assim, ao subirmos uma escada, íamos contando os degraus, especialmente com o Osório di Maraã, já que, em São Paulo, morávamos em prédios, o que não acontecia em Manaus. Com o Juarez e a Maria Rosa estudávamos tabuada quando andávamos de carro, o que todos eles gostam muito: “estar na rua, ou 'ua'”, como pronunciava o Juarez quando era criança. Eu perguntava, eles respondiam e, assim,depois, sabiam mais do que eu!

 

Mas, o fundamental, é que estudávamos e aprendíamos juntos.

 

Voltemos ao tema que vínhamos tratando.

 

Você percebeu que falei inúmeras vezes de “filosofia” e “filósofos”?

 

Claro que sim, pois você é uma menina inteligente, eu sei!

 

Então por que perguntei?

 

Para ter assunto. Kkkkkkkkk (é assim que rimos com o teclado?).

 

Eu até já lhe disse, acima, o que é filosofia e, penso, você gostou. Repito: “filosofia é o amor pela sabedoria, pelo saber”.

 

Não é simples e simpático saber o que é filosofia?

 

Vamos ouvir, no entanto, umas outras pessoas. São elas: Hilton Japiassú e Danilo Marcondes, mas não ligue muito para o que eles dizem, pois costumam ver dificuldade em tudo.

 

Aliás, você percebeu que o “Japiassú” é acentuado com agudo na última sílaba? Não ligo muito para isso (escrita dita errada, pois me preocupo mais em compreender a mensagem), mas como você ainda vai prestar (fazer, como se diz lá no Amazonas) alguns concursos em que é cobrada a língua portuguesa, saiba que a regra da gramática diz o seguinte: acentuam-se com acento agudo as palavras oxítonas terminadas com as vogais tônicas a(s), e(s), o(s). Ou seja, o acento agudo em “Japiassú” não obedece a essa regra! Sacou?

 

Mas, dizem esses mestres o seguinte:

 

Filosofia. É difícil dar-se uma definição genérica de filosofia, já que esta varia não só quanto a cada filósofo ou corrente filosófica, mas também em relação a cada período histórico [Osório diz: não vá nessa Fernanda, estudando tudo fica fácil, compreensivo. ]. Atribui-se a Pitágoras [Osório diz: esse é o primeiro dos malucos sobre os quais lhe falei acima.] a distinção entre a sophia, o saber, a philosophia, que seria a “amizade do saber”, a busca do saber. Com isso se estabeleceu, desde a sua origem, uma diferença de natureza entre a ciência, enquanto saber específico, conhecimento sobre um domínio do real [Osório diz: a matemática, a física e a medicina, por exemplo. ], e a filosofia que teria um caráter mais geral, mais abstrato, mais reflexivo, no sentido da busca dos princípios que tornam possível o próprio saber. No entanto, no desenvolvimento da tradição filosófica, o termo “filosofia” foi frequentemente usado para designar a totalidade do saber, a ciência em geral, sendo a metafísica [Osório diz: essa palavra significa “o que está além do que é físico”, do que é material, do que é concreto.] a ciência dos primeiros princípios [Osório diz: “primeiros princípios” significa de onde tudo vem.], estabelecendo os fundamentos dos demais saberes. O período medieval foi marcado pelas sucessivas tentativas de conciliação entre razão e fé, entre a filosofia e os dogmas da religião revelada, passando a filosofia a ser considerada ancilla theologiae [que significa] a serva da teologia [Osório diz: teologia é palavra de origem grega, onde “teo” significa deus e “logos” significa “palavra” e que, por extensão, temos, portanto, análise, estudo sobre deus.], na medida em que fornecia as bases racionais e argumentativas para a construção de um sistema teleológico, sem contudo poder questionar a própria fé. O pensamento moderno recupera o sentido da filosofia como investigação dos primeiros princípios, tendo portanto um papel de fundamento da ciência e de justificação da ação humana. A filosofia critica, principalmente a partir do Iluminismo [Osório diz: movimento do qual fazia parte o tal Voltaire.], vai atribuir à filosofia exatamente esse papel de investigação de pressupostos, de consciência de limites, de crítica da ciência e da cultura. Pode-se supor que essa concepção, mais contemporânea, tem raízes no ceticismo, que, ao duvidar da possibilidade da ciência e conhecimento, atribuiu à filosofia um papel quase que exclusivamente questionador. Na filosofia contemporânea, encontramos assim, ainda que em diferentes correntes e perspectivas, um sentido de filosofia como investigação crítica, situando-se portanto em um nível essencialmente distinto do da ciência, embora intimamente relacionado a esta, já que descobertas científicas muitas vezes suscitam questões e reflexões filosóficas e frequentemente problematizam teorias científicas [Osório diz: é a filosofia que questiona se aquilo que dizem as ciências está certo ou errado.]. Essa relação reflexiva entre a filosofia e os outros campos do saber fica clara sobretudo nas chamadas “filosofia de”: filosofia da ciência, filosofia da arte, filosofia da educação, filosofia da matemática, filosofia do direito etc.

Filosofia analítica: corrente de pensamento que se desenvolveu sobretudo na Inglaterra e nos Estados Unidos a partir do início deste século, com base na influência de filósofos como Gottob Frege, Bertrand Russel, George Edward Moore e Ludwig Wittgenstein dentre outros [Osório diz: nomes feios, pois, por serem estrangeiros? Não. É que não estamos muito acostumados com eles, como estamos com os “Silva” e “Lopes”, embora conheçamos o Justin Bieber, Brad Pitt, o casal (protagonistas): Edward (Robert Pattinson) e Bella (Kristen Stewart) do filme “Crepúsculo” (Twilight) e tantos outros.]. Caracteriza-se, em linhas gerais, pela concepção de que a lógica e a teoria do significado ocupam um papel central na filosofia, sendo que a tarefa básica da filosofia é a análise lógica das sentenças, através da qual se obtém a solução dos problemas filosóficos [Osório diz: trabalham esses autores com as palavras e frases, mas, como te disse na carta anterior, não resolveram os problemas do falar e do escrever.]. Há, no entanto, profundas divergências sobre as diferentes formas de se conceber essa análise.

Filosofia como ciência rigorosa, A (Philosophie als strenge Wissenschaft) Obra de Husserl [Osório diz: filósofo nascido na Morávia, onde hoje é a República Checa, mas era mais mesmo é alemão.], publicada entre 1910-1911, na qual critica tanto os partidários do naturalismo científico, quanto os defensores do historicismo e define a filosofia como fenomenologia, vale dizer, como como apreensão do sentido dos fenômenos, pois somente ela pode captar o único ser apoditicamente dado (ou absoluto), o ser da consciência. Ciência das essências, a filosofia mostra que a consciência, pela intencionalidade capta a 'coisa mesma'”. (Dicionário básico de Filosofia, p. 104/105. Editora Jorge Zahar. Rio de Janeiro, 1996: p. 104/105).

 

Não vou nem perguntar, pois sei que você entendeu tudo.

 

Entretanto, se não entendeu, não se preocupe, é assim mesmo no início. Saiba que temos um longo caminho e as questões que hoje não foram entendidas voltarão a ser tratadas em outras cartas.

 

Portanto, divirta-se com a leitura.

 

Dizia um professor meu que “só existe uma coisa difícil na vida, morrer e nascer de novo”, o resto é fácil. Espero que concordes, ou comece a pensar assim. Ou você nunca andou de bicicleta? Lembra como foi “difícil” no início?

 

Tem gente, no entanto, que até acredita em reencarnação. Ou seja, para elas é possível morrer e nascer de novo. Eu, tô fora!

 

Saudações e que receba esta com muita saúde, juntamente com os seus!

 

Até mais,

 

Osório

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