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87.5 – Retórica e Filosofia: a gramática.

Sofística

(uma biografia do conhecimento)

 

87.5 – Retórica e Filosofia: a gramática.

 

Ensina Guthrie:

 

O intenso interesse pelas possibilidades e pelos limites da linguagem deu início ao estudo gramatical (distinção de gêneros, partes do discurso e assim por diante), do que existem traços de Protágoras em diante.

O objetivo não era de fato científico, distinguir e codificar o uso existente, mas prático, reformar a linguagem e aumentar sua eficácia por correspondência mais estreita com a realidade ["A grammatike grega antiga era uma techne, arte ou habilidade, um estudo visando à prática; a fitologia [Osório diz: botânica.] moderna não é uma techne, mas ciência física. Toma o fenômeno universal do discurso humano por objeto, e só se interessa por certificar-se e coordenar os fatos". Este texto é do ensaio muito agradável de Murray sobre Os inícios da gramática grega (em Greek stud), onde também frisa a enorme diferença resultante do fato de que a grammatike só se interessa pelo discurso grego: "Os fenômenos que os grammatikoi gregos tratavam não era toda a língua humana. Era o Logos".]. [Osório diz: bela concessão! Mas isso prova que os filósofos com (distinguir e codificar) não são práticos. Contudo, Guthrie, insiste em dizer que Sócrates era prático, com o que, absolutamente, concordamos. Péricles deve ter percebido isso, daí ter optado por Protágoras para dar leis à Túrio].

Protágoras, diz-se-nos, foi o primeiro a dividir o discurso (logos) em quatro tipos básicos (phythemenes logon): pedido (ou prece) [Osório diz: embora se insista que Protágoras era ateu, e isso debe ser uma honra para qualquer racional, ver-se que ao falar em prece se pode perguntar: a quem se faz prece? Mas melhor mesmo que o tenhamos como ateu! Caso contrário poderia ele ter-se tornado um fanático, e assim, perdido sua racionalidade aguda!], pergunta, resposta, ordem; ou, segundo outras autoridades, em sete: narração, pergunta, resposta, ordem, relato, pedido, intimação. Pouco mais tarde Alcidamas disse que os quatro logoi eram afirmação, negação, pergunta e comunicação. Isto vem de uma fonte tardia, mas Aristóteles se refere à divisão quando na Poética (…) lembra que Protágoras criticou a Homero por escrever “Canta, deusa”, porque isso era uma ordem quando o que se requeria era uma prece. [Osório diz: Protágoras versus Homero. Crítica fulminante para os inícios, e mesmo depois, do pensamento dito racional, que se iniciava].

A distinção entre nome e verbo (rhema) ocorre em Platão, e, como observa Cornford (PTK, 307), introduz-se no Crátilo (425a) sem explicação como algo familiar, e, sendo assim, provavelmente foi feita antes por Protágoras ou algum outro sofista. [Osório diz: a quem Platão plagiou?].

Literalmente, rhema significa apenas “uma coisa dita”, e um nome é contraposto a ele como aquilo de que coisas são ditas. [Osório diz: ?].

Nomes e verbos são construídos de letras e sílabas, e de nomes e verbos compomos "algo de grande, belo e completo, o Logos, formado pela arte de nomear ou retórica ou o que quer que seja, da mesma forma como uma figura viva é composta pela arte do pintor". [Osório diz: a importância da retórica!].

O interesse de Protágoras pelo gênero dos nomes é atestado por um contemporâneo. Aristóteles nos diz que foi ele que dividiu os nomes em masculino, feminino e neutro (Arte Poética, 1407b7).

E isto se reflete nas Nuvens de Aristófanes. A peça contém, sob o nome de Sócrates [Osório diz: mas era Sócrates mesmo, basta querer vê-lo!], um ataque à pretensão de Protágoras de fazer do argumento mais fraco ("injusto") o mais forte e Strepsíades, que veio a Sócrates para aprender o argumento injusto para evitar o pagamento de suas dívidas [Osório diz: aparentemente, Aristófanes foi o primeiro deturpador! Nem Platão, nem Aristóteles chegaram a tanto! É que ele, filhadaputalmente, trocou fraco por injusto, quando a doutrina é: fazer do mais fraco o melhor. O mais fraco nem sempre é injusto! Os advogados vivem disso: tornar os argumentos de seus clientes os melhores. Um miserável, que embora seja a vítima, mas que não saiba expressar sua causa (a melhor, obviamente) a terá conhecida como a pior, a mais fraca!], fica desanimado ao descobrir que deve primeiro aprender "sobre nomes, quais deles são masculinos e quais femininos" [Osório diz: fantástico isso, pois Platão e Aristóteles apresentam os sofistas como “apenas ensinando a falar, sem se preocupar com o conteúdo da fala”, mas, aqui, ao contrário, demonstra-se que, para poder falar com a eficiência com a qual os sofistas faziam Atenas e Platão tremer, é necessário todo um preparo/conhecimento profundo e anterior, obviamene]. Sua falha (em comum com todos os seus compatriotas gregos) de distinguir animais de sexo diferente por terminações diferentes, e seu uso de artigo masculino com nomes que têm o que é comumente uma terminação feminina, lhe vale uma aguda censura de "Sócrates" [Osório diz: quem é mesmo que faz censuras agudas aos “ditos sábios que nada sabem”? Sócrates, por certo]. Esta crítica da gramática da linguagem comum que a corrige como ilógica e imprecisa aparece de novo na afirmação de Protágoras de que as palavras gregas para "fúria" e "capacete", que são femininas, deviam ser masculinas.

Pródico é mencionado no Eutidemo (277e) como alguém que insistiu na importância capital da "correção dos nomes", que Sócrates aí chama a primeira fase da iniciação nos mistérios dos sofistas. Sua especialidade era precisão no uso da linguagem e distinção acurada do significado das palavras comumente consideradas sinônimos.

Ele [Osório diz: Pródico] me censura, diz Sócrates no Protágoras (…) por usar uma expressão como “terrivelmente sagaz”. “Terríveis” (deinos) deve qualificar coisas desagradáveis como pobreza, doença ou guerra. [Osório diz: ela é terrivelmente linda! Nunca! Jamais!].

O mesmo diálogo [Osório diz: Eutidemo] contém uma paródia de seu ensino, um discurso um tanto pomposo em que ele distingue entre discussão e disputa, estima e louvor, prazer e gozo. No Laches (…) ele é mencionado, em conexão com a distinção entre coragem e falta de medo, como "o melhor dos sofistas em traçar distinções deste tipo". Aristóteles o apresenta listando gozo, deleite e satisfação como subdivisões de prazer, e em conexão com isso um comentador tardio lhe credita a "invenção" da "exatidão verbal" [terpsis, chara e euphrosyne, Ar. Top. 112b22; cf. coment. sobre Phaedr. = Hermias, p. 283 Couvreur (não em DK, mas acrescentado por Untersteiner, Sof. II 173s): Pródico ten ton onomaton euren akribeian. Segundo o comentador, terpsis era o prazer pelos ouvidos, chara prazer da mente, e euphrosyne prazer visual; uma classificação que, se realmente de Pródico, mostra uma vez mais o caráter normativo antres que descritivo deste tipo de ensino, pois dificilmente corresponde ao uso ordinário. (No discurso de Pródico no Protágoras, euphrainesthai é contrastado por hedesthai, e é definido como o gozo resultante do exercício do intelecto). O comentador, porém, provavelmente terá introduzido uma classificação estóica. Cf. Alex. em DK, 84 A 19, e veja sobre isto Classen em Proc. Afr. C. A 1959, 39s. Classen pensa que até Aristóteles confundiu Pródico com diairesis platônica.].

Talvez a coisa mais interessante a este respeito seja a evidência de relacionamento pessoal entre Pródico e Sócrates, que se refere a ele várias vezes em Platão como aluno e amigo de Pródico [Concordo com H. Gomperz (S. u. R. 93) que estas alusões não se podem descartar como gracejos sem nenhum fundamento histórico. [Osório diz: de onde se tira tal conclusão? Deveria Guthrie explicar, já que quer explicação de tudo, com justa razão]]. A insistência de Pródico em distinguir precisamente entre palavras de significado estreitamente relacionadas tem afinidades óbvias com o hábito socrático de apertar o interlocutor e obrigá-lo a dizer o que é coragem, temperança, virtude, ou qualquer coisa que seja objeto de sua discussão [Osório diz: embora ele mesmo não diga, mas seja, por isso, aplaudido por muitos] — qual seja sua forma ou ser; e o ensino de Pródico pode bem ter tido influência em dirigir seu pensamento por estas linhas. Se, como escreveu Calógero, "a diferença entre as duas aproximações é muito aguda", Pródico, preocupando-se apenas pelo "falar correto" e Sócrates interessando-se pela "coisa real" [Osório diz: acima tem-se as coisas reais! Coragem, temperança, virtude...], ou se, como o propõe W. Schmid, a arte de divisão de Pródico foi uma "fertilização científica da esfera socrática de pensamento" e "sua tentativa de aguçar e regulamentar o uso da linguagem por exigências lógicas uma preparação, sem dúvida, valiosa para o esclarecimento conceitual da linguagem literária”, [Osório diz: bem melhor a avaliação de Pródico] é questão que será tratada mais tarde [Para estimativas ulteriores do valor da obra lingüística de Pródico v. Grant, Ethics, 1, 124s. ("Devemos reconhecer o mérito desta primeira tentativa de separar os diferentes matizes da linguagem, e de fixar uma terminologia" etc.) [Osório diz: esse tal de Grant só podeia estar bêbado ao valorizar o sofista! Daí o nome do uísque!]; H. Gomperz, S. u. R. 124-6 (o objetivo da instrução era retórica – de outra forma jovens não lhe teriam pago 50 dracmas por vez para ouvi-lo! — todavia "aus der Bedeutungslehre des Prodikos ist die Begriffsphilosophie des Sokrates erwachsen" [Osório diz: tradução?]); e outras autoridades referidas em Untersteiner, Sophs. 225, n. 66. Untersteiner não está muito correto ao dizer na p. 215 que "todos os estudiosos estão de acordo" sobre a questão.]. Pode-se acrescentar aqui, porém, que Pródico como os sofistas tinha alta reputação como orador político e deu exibições públicas pagas de eloquência, e também, como Protágoras, empreendeu o ensino da arte do sucesso na política e na administração de Estados. É, portanto, provável que sua insistência em linguagem precisa tenha ocorrido no contexto do ensino da retórica [Osório diz: e qual o problema nisso, como transparece da insinuação de Guthrie?]. (Fonte: Os sofistas, W. K. C. Guthrie, tradução, João Rezende Costa, Paulus, São Paulo, 1995, p. 205-208).

 

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