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77.1 – Relatividade dos valores (consequências para a teoria ética).

Sofística

(uma biografia do conhecimento)

 

77.1 – Relatividade dos valores (consequências para a teoria ética).

 

[Osório diz: a teoria ética que é posterior a apontada relatividade dos valores. Ou seja, ela não foi discutida pelos autores do relativismo].

 

Se filosofia física começa com a admiração, pode-se dizer que a ética começou com o ceticismo. Grant, Ethics, 1,155

 

O capítulo sobre os sofistas (p. 50) mencionou a divisão de Alexander Grant da moralidade em três estágios, correspondendo numa nação a infância, adolescência e maturidade no indivíduo. Num aspecto sua divisão não passaria hoje sem desafios. Ele chama a segunda era, a cética ou sofística, de era de "transição", concluindo que só a terceira, a saber, a do retorno a crenças anteriores [Osório diz: é o que Nietzsche irá chamar de fim da filosofia e, acrescento, retorno da teologia, da crendice, do xamanismo, da superstição, com o autor espanhol Francisco Rodrigues Adrados. Platão irá destruir todo o esforço da razão pela besteira da fé! E isso por uma simples razão, por não ter encontrado respostas para as questões abertas/expostas por seus antecessores!] mantidas mais profundamente porque obtidas por pensamento independente, representa a maturidade. No pensamento grego, a transição ter-se-ia dado rumo ao idealismo de Platão, uma reafirmação e uma defesa dos valores absolutos aceitos pela "simplicidade e confiança" da infância como o são na fase pré-crítica da sociedade. A segunda fase, a fase cética, também poder-se-ia chamar de positivista, e não se aceita absolutamente em geral que crença em valores absolutos seja mais madura do que positivismo. Nem todo adulto recupera as convicções de sua infância.

O positivista rejeita a ideia de que a lei positiva deva partir do ideal de um padrão de direito natural, ou seja, universalmente válido: existem apenas direito ou bondade relativos que derivam da lei positiva prevalecente em certo tempo. O positivista sabe que a busca da verdade é caça de quimera [Osório diz: como todo aquele que não é fanático pelo inexiste!]. De forma semelhante, a beleza, tal como foi para Hume, não é “uma qualidade nas próprias coisas, mas apenas existe nas mentes que a contemplam, e cada mente percebe uma beleza diferente”. Com tais afirmações (p. 155), o positivista moderno não gostaria que se lhe dissesse que seu ponto de vista é pré-platônico ou adolescente, mas de fato repete as afirmações de sofistas na controvérsia dos sécs. V e IV a.C [Osório diz: e é isso mesmo! Onde o demérito em ser pré-platônico? Ao contrário, isso é uma honra!]. Valor para ele, da mesma forma que para Arquelau, existe somente pelo nomos, e não pela physis. Para Ayer sequer existe controvérsia:

 

Quando se fala de valores, não se trata de descrever o que pode ou não existir, o problema está em se existe ou não existe realmente. Ora, problema deste tipo não existe. O problema moral é: O que devo fazer? Que atitude devo tomar? E juízos morais são divertidos neste sentido. Podemos ver agora que toda disputa acerca da objetividade de valores, tal como geralmente se conduz, é sem sentido e inútil. [Osório diz: até agora, também tem sido sem sentido “o que devo fazer?” ou “que atitude devo tomar?”, já que ninguém sabe dizer, indicar, tudo depende das pessoas envolvidas, do tempo e do local! Ou seja, continua o pintor tentando segurar-se no pincel! Assim, portanto, os valores continuam relativos, tenham ou não existência!]

(...)

Em Eurípides, uma personagem pergunta retoricamente: “Que ato é vergonhoso se não parece ser tal para o agente?”, que teve de Aristófanes e paródia: “Que ato é vergonhoso se não parece ser tal para o auditório?”, e tanto a Platão como a Antístenes se atribui a resposta: “Vergonhoso é vergonhoso, quer pareça, quer não”. [Osório diz: fantástica resposta para quem era um pseudo dono da verdade, Platão!]

(...)

Sócrates, em Platão, diz “quando pronunciamos palavras como “ferro” ou “prata”, todos sabemos o quer queremos dizer, mas quando dizemos “justo” ou “bom”, discordamos uns dos outros, e até mentalmente. Estas citações dão uma idéia da atmosfera cética da época, a que o próprio Sócrates se opôs vigorosamente, sustentando que o acordo quanto ao sentido de termos morais era na prática preliminar necessário para a modalidade”. [Osório diz: o “acordo” protagórico! Logo, se é fruto de acordo, não existe por natureza! Não é “divino” nem “imutável” nem “intangível”!].

 

Perguntas de retórica:

 

É uma pergunta para a qual a pessoa que fez já sabe a resposta.

P. exemplo: quando uma criança tenta enganar a mãe essa pergunta: Tá pensando que eu sou boba? Logicamente ela já sabe qual é a resposta, a própria pergunta já tem uma resposta em si.

 

e,

 

Perguntas de retórica (em que o orador não espera que seus ouvintes respondam) estimulam o raciocínio do ouvinte.

Observe como Jesus usou perguntas de retórica em Mateus 11:7-11. As perguntas também têm outra utilidade. Muitas vezes, antes de podermos ajudar a uma pessoa, temos de saber o que ela pensa. Visto que, diferentes de Jesus, não podemos ler o coração das pessoas, só existe uma forma de obtermos esta informação: fazer perguntas ponderadas.

As perguntas podem ajudar o ouvinte a perceber os motivos dos pontos salientados. Ajudam-no a desenvolver o raciocínio.

Quando fala em público ou conversa com uma pessoa, tente usar perguntas a fim de chamar a atenção para ideias importantes. Certifique-se de que elas tratem de assuntos que realmente interessam à assistência. Você pode também usar perguntas intrigantes, sem respostas óbvias. Se fizer uma pausa breve depois de uma pergunta, a assistência provavelmente escutará com mais interesse o que se segue.

 

Fonte(s):

 

COMO FAZER

 

Para iniciar uma conversa, use perguntas sobre assuntos que realmente interessam à outra pessoa.

Antes de transmitir uma ideia importante, experimente usar uma pergunta que deixe os ouvintes na expectativa.

Use perguntas para mostrar a base das suas declarações, a lógica das verdades apresentadas e o bom efeito que essas podem ter na vida dos ouvintes.

Use perguntas para estimular o ouvinte, não só a repetir fatos, mas a expressar sua opinião sobre o que aprendeu.

 

Fonte: https://br.answers.yahoo.com/question/index?qid=20061009071729AAVdfNT.

 

O mais celebre advogado da relatividade de valores (embora, como inevitavelmente acontece, seu pensamento tenha sido amiúde distorcido ao ser filtrado por outras mentes menos dotadas) foi Protágoras, e seu desafio filosófico a normas tradicionalmente aceitas baseava-se por sua vez em teorias relativas e subjetivas de ontologia e epistemologia. [Osório diz: Protágoras está numa sinuca de bico! Os filósofos dizem que ele não é um pensador “amante da sabedoria”. Os outros dizem que ele é um niilista/ralativista! Veja-se:

[Osório diz: Na verdade, Protágoras é as duas coisas:

(I) um exímio pensador (propôs questões irrespondíveis e não solucionáveis, como fizeram, de resto, os tidos por filósofos. Por esse seu talento foi escolhido por Péricles para seu conselheiro.

(II) foi um homem de ação, tanto assim que escolhido por Péricles para dar lei a uma cidade (Túrio).

Portanto, no meu entender, o homem perfeito, pois sabia agir, não se perdendo em seus pensamentos agudos.

 

Enquanto aplicada a valores, relatividade pode significar uma das duas coisas: (a) Não há nada a que se possam aplicar os epítetos bom, mau e semelhantes de maneira absoluta e sem qualificação, porque o efeito de tudo é diferente segundo o objeto sobre que ele exerça, as circunstancias de sua aplicação e assim por diante [Osório diz: o mesmo vale para a poesia!]. O que é bom para A pode ser mau para B, o que é bom para A em certas circunstancias pode ser mau para ele em outras, e assim por diante. A objetividade do efeito bom não é negada, mas varia em casos individuais. (b) Quando um locutor diz que bom e mau soa apenas relativos, pode significar que “não há nada bom ou mau, mas o pensamento o torna tal”. Toda investigação da antítese nomos-physis fornece numerosos exemplos disso: incesto, abominável aos olhos dos gregos, é normal aos olhos dos egípcios, e assim por diante. Com valores estéticos, o caso ainda é mais óbvio.

Heráclito aduzira antes o primeiro tipo de relatividade como justificação de seu paradoxo da identidade de opostos: “Água de mar”, disse ele, “é ao mesmo tempo a mais pura e a mais poluída, sendo potável e salutar para peixes, não-potável e mortal para homens”. Protágoras desenvolve o tema em resposta à sugestão de Sócrates de que “bom” pode-se equiparar com “benéfico para homens” [Platão, Prot. 333e-334c. A equiparação utilitária de agathon com ophelimon foi favorita em Sócrates. (v. Sócrates, c. III, § 8). Também não se pode duvidar que o discurso de Protágoras representa seu real modo de ver. Xenofonte (Mem. 3.8.7) apresenta Sócrates dizendo algo semelhante (o que é bom para um homem faminto é mau para um homem com febre etc.), e por este motivo ele foi acusado de lhe atribuir a paternidade das ideias de Antístenes (Caizzi, Styd. Urbin. 1964,65; não, muito estranho, de Protágoras). Mas o argumento de Sócrates ai é que a bondade de qualquer coisa está em sua adequação para realizar sua própria função - um incontestável princípio socrático (cf. Rep. 352e-353d). O seu pensamento era intensamente prático [Osório diz: a impressão que se tem o contrário! Que seu pensamento não era nada prático, mas apenas questionador, filosófico! A escolha de Protágoras para dar leis a Túrio, quando Sócrates vivia, pode apontar nesse sentido]: o que é bom deve ser útil, e a mesma coisa pode ser útil ou danosa segundo as circunstancias (Meno 87e 88c e Xen. Mem. 4.6.8). Precisamente como seu pensamento diferia do de um sofista como Protágoras é longa questão [Osório diz: “eu adoro histórias longas”!], mas não é certo dizer como diz Caizzi que a passagem em Xenofonte é "fortemente antiplatônica" (pelo que ela significa contra o Sócrates platônico).]: [Osório diz: não se pode misturar homens (seres racionais) com os outros animais (seres irracionais)]

 

Ainda que coisas não sejam benéficas para homens, eu ainda as chamo de boas... Sei de uma multidão de coisas – alimentos, drogas, e muitas outras – que não são prejudiciais a homens, e outras que são benéficas; e ainda outras que, na medida que se referem a homens, não são nenhuma das duas coisas, mas são prejudiciais ou benéficas a cavalos, e outras somente ao gado ou a cachorros. Algumas não têm nenhum efeito sobre animais, mas só sobre árvores, e algumas ainda são boas para as raízes das árvores, mas danosas para os rebentos novos. Esterco, por exemplo, é bom para todas as plantas quando aplicado a suas raízes, mas muito destrutivo se colocado nos brotos ou rebentos novos. Ou tomemos o óleo de oliva. É muito mau para as plantas, e muito inimigo dos pelos dos animais exceto do homem, visto que o homem acha que pode servir tanto ao cabelo como ao resto do corpo. Tão diversa e multiforme é a bondade que mesmo em nós a mesma coisa é boa quando aplicada externamente e mortal quando tomada internamente. Todos os médicos proíbem aos doentes usar óleo na preparação de alimentos, a não ser em quantidade mínima.

 

Que um sofista ao mesmo tempo exibisse seu conhecimento multifário está em seu caráter [Osório diz: isso é uma condenação? Qual o problema? Onde o erro? Para se ter conhecimento multifário não é necessário “conhecimento” adquirido anteriormente?].

 

Em Teeteto (167-c), Protágoras diz: “Quando homens exercem sua habilidade sobre corpos, eu os chamo médicos, quando sobre as plantas, agricultores. Estes também, se a planta está doente, dão-lhe sensações sãs, saudáveis e verdadeiras em vez de más; e de modo semelhante, oradores bons e habilidosos fazem processos bons em vez de maus parecerem justos a cidades”.

 

Versenyi frisa os estreitos paralelos que existem entre Protágoras e o tratado hipocrático Sobre a medicina antiga:

 

Ambos frisam o fato de que suas artes são invenções humanas antes que dotes naturais, que são necessárias por causa da diferença entre um homem e outro e entre homens e animais, e de que há uma relatividade que resulta do que é bom para cada um. Ambos afirmam que "nosso presente estilo de vida" (leis, costumes, regime) não vem da natureza, "mas se descobriu e se elaborou durante longo período de tempo".

O objetivo de ambas [a saber, das artes política e médica] é achar o que é útil, apropriado e adequado ou devido à natureza do que cada uma tem a seus cuidados para promover vida saudável, harmoniosa e sem perturbação. Esta semelhança de objetivo, método e (quase) objeto não só leva a constante associação das duas, mas as vezes também torna muito difícil traçar linha divisória precisa entre elas.

 

O “discurso”, disse Górgias (Hel. 14), “tem a mesma relação com a mente que as drogas têm para o corpo. Assim como as drogas eliminam diversos humores do corpo e algumas põem termo à doença e outras à vida, assim também as palavras podem induzir alegria ou tristeza, temor ou confiança, ou através de má persuasão, drogar e se apoderar da mente”. Esta teoria foi levada, de fato, à prática por Antífon em sua “clínica psiquiátrica” tal como se narra na Vida dos dez oradores: alugando uma sala apropriada em Corinto, ele “desenvolveu ‘uma arte de consolar’ paralela à terapia do corpo pelos médicos” [[Plut.] Vitae 833c, Antifon A 6. Sobre isto e a identidade de Antifon v. abaixo, pp. 114s. Sugere-se intuição psicológica também por seu dito (fr. 57) de que doença é férias para os preguiçosos, pois não precisam sair para o trabalho. Supus aqui o fato de que a narrativa em Vitae e verdadeira, mas v. pp. 268s, com notas.].

 

Protágoras …

 

Antífon (fr. 60): Entre os interesses humanos a educação é primária, pois em qualquer empreendimento, quando o começo é certo, é provável que o resultado também seja certo. Assim como se lança a semente fundo no chão e dela se pode esperar a colheita, assim também, quando se lança a boa educação nos jovens, seu efeito vive e brota pela vida inteira, e nem a chuva nem a seca podem destruí-la. [Osório diz: os sofistas e a educação].

 

O aprendizado da medicina pode-se comparar com o crescimento das plantas. Nossa habilidade natural é o solo. As ideias de nossos mestres são como se fossem as sementes. Aprender desde a infância é análogo ao cair das sementes muito cedo sobre o terreno preparado. O lugar da instrução é como se o nutrimento que vem do ar circundante para as coisas semeadas. Diligência é o trabalho do solo. O tempo fortalece todas estas coisas, de sorte que sua nutrição seja perfeita. [Osório diz: os sofistas e a educação].

Estas passagens devem aumentar nossa intuição sobre a mente do sofista e ajudar nossa compreensão do uso por Protágoras de exemplos médicos e agrícolas ao responder à pergunta de Sócrates. Eram os escritores médicos que sobretudo insistiam (como o exigia o sucesso em sua habilidade) na relatividade de "bem" e "mal" para indivíduo. [Osório diz: estas comparações não envolvem sentimentos, paixões. Os indianos gostam muito de comparar o amor entre um homem e uma mulher ao de um casal de moscas, por exemplo].

(...)

Já vimos como estava difusa a tendência a substituir os conceitos de interesse e vantagem, de útil e benéfico (sympheron, chresimon, ophelimon), com o que naturalmente se liga o de apropriado e adequado (epitedeion), pelo padrão universal de “justiça” ou "direito". Como "o interesse do mais forte" (Tucídides, Trasímaco), tornou-se uma doutrina de auto-engrandecimento e desprezo dos direitos dos outros, mas em si era simplesmente utilitário e prático. Associada a ele está a noção de necessidade (ananke), e aos exemplos já citados (pp. 96s acima) pode-se acrescentar outro tirado da Medicina antiga, cap. 3, que enfatiza o liame entre atividade prática e a concepção relativa de valores: "o fato é que a mera necessidade levou os homens a buscar e descobrir a medicina, porque a homens doentes não aproveitava nem aproveita o mesmo regime que a homens com saúde". O que por sua vez se vincula com toda a visão evolutiva do progresso humano (p. 82 acima).

Uma deliciosa ilustração desta associação na mente grega é o "contexto da beleza" no Simpósio de Xenofonte (cap. 5). Sócrates quer provar aos companheiros que é mais belo do que o jovem e belo Critóbulo. Critóbulo enfim lhe concede, dizendo que tudo é belo (kalon) se for bem construído para o propósito para o qual nós o adquirimos, ou for adotado pela natureza para nossas necessidades. Então, replica Sócrates, se temos olhos para ver, os meus são mais belos que os seus, visto que, sendo saltados e salientes, podem ver longe de lado e não só reto para frente; e assim por diante. (A passagem é traduzida por extenso em Sócrates pp. 67s).

Será que também Protágoras acreditava na relatividade dos valores no segundo sentido, de que todos os juízos de valores são meramente subjetivos? A primeira vista, pelo menos, pareceria conclusão inaceitável do seu famoso dito de que o homem é a medida: 15 "o homem e a medida de todas as coisas, das coisas que são o que são, e das coisas que não são o que elas não são". Em Teeteto (152a), Sócrates pergunta a Teeteto se leu o trecho. "Muitas vezes", replica ele. "Então sabes que ele o propõe mais ou menos assim, que assim como algo me parece, assim é para mim, e assim como aparece para ti, assim é para ti - tu e eu sendo homens." Uma vez que esta adição e feita em praticamente as mesmas palavras que em Crátilo (386a), também deve ser parte do argumento pessoal de Protágoras [Osório diz: tudo bem, somente não se pode esquecer que Platão era um autor teatral, logo faz seus personagens falarem o que ele quer, justamente para apoiar a tese que ele, Platão, defende!], e isto é confirmado por Aristóteles, que acrescenta que as "coisas" em questão envolvem valores (Metaf. 1062b13):

 

Protágoras disse que o homem é a medida de todas as coisas, significando simplesmente que o que parece a cada um seguramente também é. Se é assim, segue que a mesma coisa tanto é como não é, e tanto é boa como má, e qualquer coisa que se afirme em afirmações contrárias, uma vez que muitas vezes uma coisa determinada parece boa (ou bela, kalon) a alguns e o oposto a outros; e o critério (metron) é o que parece a cada indivíduo [Se se admite que os "Duplos argumentos" (pp. 291ss abaixo) refletem o ensino de Protágoras, fornecem mais provas de que sua relatividade incluía conceitos como bom e mau, certo e errado, louvável e censurável. [Osório diz: a discussão, até aqui, é se a tese de Protágoras, quanto ao homem medida, envolve valores!]].

 

Até aqui, tudo bem, mas temos agora notável desenvolvimento. Como diz Sócrates (Teet. 161css), baseando-se na tese que viemos expondo, ninguém pode ser mais sábio do que outrem, e não teria sentido que Protágoras ou outro qualquer se apresentasse como mestre [Osório diz: ao contrário, Protágoras afirma que todos podem ser mestres, desde que obtenham apoio (acordo) para suas teses e é para ensinar a obter tais acordos que ele se propõe ser professor!]. Sócrates oferece uma defesa que Protágoras teria dado, diz ele, se fosse vivo [Evidentemente o que segue não se podia encontrar nos escritos de Protágoras, mas é aprovável que se afaste do sentido do que ensinou. Como Cornford diz, ele deve ter reconciliado sua profissão de sofista com sua afirmação de que todas as crenças são verdadeiras, e não existe nenhuma outra maneira pela qual pudesse fazê-lo. Expõe-se a questão amplamente em H. Gomperz, S. u. R. 263ss, e para outras referências V. Untersteiner, Sophs. 7os. (N. 1). S. Moser e G. L. Kustas, em Phoenix, 1966 afirmam que "”ler o Protágoras antes do Teeteto” foi uma das principais causas de interpretação errônea do diálogo anterior.” Esta afirmação depende de aceitar a suposição de Th. Gomperz (Gk. Th 1.457s) de que um representa um Protágoras "genuíno" e outro um Protágoras “imitado” - procedimento altamente arbitrário [Osório diz: mas provável, desde que se entenda que o autor é um autor teatral!]. ] [Osório diz: Portanto, não Sócrates, mas Platão dá resposta por quem morto está!]. Consiste em sustentar que, embora todas as crenças sejam verdadeiras, nem todas são igualmente boas (agatha) [Platão usa várias palavras nesta passagem, das quais todas se traduzem com frequência por "mau" e "bom". Em cartas romanas eu apresento uma abordagem inacabada dos diversos sentidos que transmitiam a um grego. Kakon: a palavra mais geral para mau; agathon: a palavra mais feral para bom, como o matiz de condutivo a uma realização eficaz de função comumente presentes em termos gregos de aprovação; poneron: que causa fadiga, angústia, dor e tristeza (do nome ponos, trabalho, perturbação, sofrimento) chreston: útil, efetivo, íntegro (ligado a hygieinon, saudável, em 67cl); kalon: bela, bonito, de boa qualidade, louvável, honroso.]. o homem sábio (sophos) é aquele que pode mudar o que parece e é mau (kakon) para qualquer de nós e fazê-lo parecer e ser bom. (a) O alimento do doente Ihe é amargo: não se pode dizer que está errado quando afirma que o é, nem que é mais ignorante que o homem são. Mas o doutor, sophos na arte de curar, pode mudar de tal modo sua condição que tanto lhe parece como é doce e agradável. (b) Na educação, o sofista faz com palavras o que o doutor faz com drogas (compare Górgias, p. 169 acima), ou seja, muda o aluno para um estado melhor. Ele não o faz trocar falsas crenças por verdadeiras, pois crenças falsas são impossíveis; mas, quando um homem tem um estado pervertido (poneron) de mente e pensamentos correspondentes, ele torna sua mente sã, dando-lhe pensamentos sãos (chresta) - não mais verdadeiros, mas melhores. (c) Coisas que toda uma cidade pensa ser justas e honradas (kala) são-lhe tais enquanto ela pensa que o são; mas nos casos em que elas são danosas (ponera), o homem sábio as substitui por outras que são e parecem sãs (chresta). Permite-se, assim, que certos homens sejam mais sábios do que os outros, embora ninguém pense falsamente [Osório diz: o que difere um homem sábio de um outro].

Temos aí um paradoxo: as crenças de dois homens podem ser igualmente verdadeiras, mas não igualmente valiosas, ainda que sejam crenças sobre a bondade ou maldade de algo. No caso de sensações físicas, pelo menos no exemplo de Platão, não há dificuldade. O homem doente se desagrada com o que prova, e ficará contente quando o doutor, por assim dizer, restaurar sua apreciação normal do alimento bom ou, como Protágoras o diria, faz o alimento desagradável tanto lhe parecer como ser agradável. Mas com valores morais o caso é diferente. Se o que uma cidade pensa ser justo e certo é justo e certo enquanto ela pensa que o é, ela não quererá que se mudem suas ideias ou suas leis e nem, poder-se-ia pensar, deveriam ser mudadas [Osório diz: mas esse não é o Problema de Protágoras (que sempre terá o sábio a mostrar algo melhor pelo qual se deve mudar), mas o de Sócrates (que prega a submissão total à lei da cidade)]. Seriam como o óleo de oliva do discurso de Protágoras, boas para aquela cidade, se bem que talvez não para outras. Parece, porém, que a cidade pode não ser sábia, nem seus juízos sãos e benéficos, mas inúteis e propensos a causar mal. Como então podem eles ser, e também parecer, justos e certos (kala) para a cidade? [Osório diz: por falta do sábio para mostrá-lo!].

Protágoras busca sua própria solução para a questão quente do dia, a relação entre nomimon e dikaion, lei positiva e moralidade. Foi dito [Osório diz: por quem?]:

(1) Que ambos eram idênticos por definição, e a afirmação de sua identidade, simplesmente analítica. Isto pode ser (a) a velha ideia religiosa, remontando a eras tribais, de que as leis vieram dos deuses, e assim não podem errar e deve-se-Ihes obedecer ("todas as leis humanas são nutridas pela única lei divina") [Osório diz: aqui Guthrie vacilou! Dormiu! Cochilou! Dirá aos padres: “foi sem querer, querendo!” / Foi a essas eras tribais que voltou a “teologia” (não filosofia) de Platão]; ou (b) uma crítica consequente a equiparação dos dois: dada a definição, de que "justiça" inclui somente o que é mandado ou sancionado pelas leis, então, como frisou Antifon, a homem tem o direito de observá-la apenas na medida que coincide com seus próprios interesses, e o dever de ignorá-la sempre que conflita com o fato da natureza como a igualdade de gregos e bárbaros, nobres e plebeus, ricos e pobres.

(2) Como resultado de (b), negava-se a identidade de justo e legal. "Justo" e "certo" representavam valores morais, que não se podiam equiparar com os ditames da lei positiva, pois a lei podia ser injusta e por sua vez o que era justo se estendia para além do campo da ratificação legal. [Osório diz: diferença entre legal e justo!].

Havia a doutrina do contrato social tal como afirmada por Sócrates, segundo a qual, embora o maquinismo legal possa em caso particular levar a julgamento injusto, continuava certo para o cidadão aceitá-lo, porque sua pertença ao Estado implicava a promessa de obedecer às leis em troca dos inúmeros benefícios da cidadania. [Osório diz: Isso não é hedonismo? Vantagem? Mas a lei, por acaso, é para caso particular, somente se trouxer benefícios para e pelos quais se a obedece?].

Protágoras (…) sustentava que, embora as "leis" não viessem "pela natureza", sua instituição e observância eram necessárias para a preservação da sociedade. A função inteira de nosso senso de justiça (dike) é "tornar possível a ordem política" (p. 67 acima). Por isso ele naturalmente se inclina para os que equiparam dikaion [moralidade] com nomimon [lei positiva]. Todavia nos meados do sec. V era impossível para o pensador ignorar a existência de leis más, e tentou uma solução que as levasse em conta. Se o resultado é argumento inconsistente e circular, o seu interesse está no estado da questão na época, que levou Protágoras a tomar este curso tortuoso [ "Que aí temos um círculo lógico não se pode negar... Se juízos de valor só são válidos para o indivíduo, como pode um juízo de que duas crenças são de valor desigual ser válido para mais que o indivíduo que o faz” (Gomperz, S. u. R 269) [Osório diz: a chave está justamente em Górgias e Protágoras. Górgias com suas três teses, com as quais concorda Gomperz na sua pregunta. Protágoras com seu mito de Prometeu. Embora ambos sejam iguais, a princípio, um pode, já que não há ponto de acordo absoluto e certo, convencer o outro a aderir a sua causa!]]. É, afinal, uma questão que se quer hoje se resolveu. [Osório diz: Protágoras disse: o que temos são as leis, e as leis são essas que estão aí e, portanto, se é isso que temos, vamos usar. Ninguém, durante um afogamento, dispensará um pedaço de qualquer que flutue por que está esperando um colete inflável!].

Uma vez que Protágoras era famoso por sua afirmação de "fazer do argumento mais fraco o mais forte", H. Gomperz (S.u. R. 269) sugeriu que ele pode ter usado estes epítetos aqui, antes que "pior" ou "melhor", que Platão usa em sua defesa e que fazem a circularidade particularmente berrante [Osório diz: Platão parece sempre agir de má-fé, como todo enrustido!]. Não alterariam essencialmente o caso, mas dariam aparência de padrão mais objetivo. A explicação de Gomperz do paradoxo e que cada qual está certo porque cada um vê uma faceta da verdade, aquela que sua disposição lhe permite ver, mas (como no caso da saúde do corpo) há disposições normais e anormais, e o homem mais normal, que Protágoras chama de sábio, tem a crença mais normal, mais forte e melhor. Sua teoria corresponde a sua prática retórica, e de fato uma justificação epistemológica da importância da retórica. O retor deve ser capaz de defender pontos de vista opostos com igual sucesso, levando finalmente um a vitória como o "mais forte". Precisamente assim o epistemólogo prova que todas as ideias são igualmente verdadeiras, pois cada qual apreende uma faceta da verdade, decidindo depois por uma como a "melhor". Para Protágoras, o retor é idêntico com o sábio, porque foi treinado a ver ambos os lados, ao passo que o leigo só vê um lado da verdade, mas verdade parcial (p. 275). 21 [Osório diz: trecho fantástico sobre o argumento forte e o fraco! Guthrie superou-se!].

O que importa é que o critério de Protágoras é quantitativo: todos os juízos são igualmente verdadeiros, mas não igualmente valiosos porque, segundo apanham mais ou menos realidade, são mais ou menos normais ou anormais e assim mais fortes ou mais fracos [Osório diz: quantitativo quanto a abrangência, no caso, mas, também, quanto a quem os defende. Melhore e mais conceituados, melhor a possibilidade de explicação (formulação de acordo) e aderência por parte dos demais. Argumento de autoridade e autoridade do argumento devem ser analisados]. A explicação tem suas atrações, mais é enfraquecida por seu apoio nos conceitos de “normal” e “anormal”, pois como disse Cornford (PTK, 73) “mais são” para Protágoras “não significa 'normal', pois isto estabeleceria a maioria como norma e medida para a maioria”. [Osório diz: Isso foi o Cornford quem deduziu! Mas é isso mesmo? Não tem outro critério? Os sábios decidem, disse Protágoras, sem qualificar em “normal” e “anormal”! Ademais, Protágoras é um democrata e, como tal, a “a medida da maioria” é a única possibilidade diante das 3 teses de Górgias. Portanto, nada é enfraquecido, ao contrário, é fortificado] Só pode significar mais útil ou apropriado, uma crença que produzirá mais efeitos no futuro; [Osório diz: não! O Sábio estará aí para corrigir algo que, embora produza mais efeito no futuro, seja pior! Uma bomba atômica, embora produza mais efeitos no futuro, pode ser pior, como mostra a história moderna] isto, é, para o indivíduo, efeitos que tanto serão como parecerão melhores para o aluno do sofista depois de seu treinamento~[Osório diz: o aluno dos sofistas não se torna cego nem autômato, ao contrário, é treinado para pensar, e, justamente por pensar, pode e deve descobrir que, como sábio que se tornou, que estará aí para corrigir algo que, embora produza mais efeito no futuro, seja pior! Uma bomba atômica, embora produza mais efeitos no futuro, pode ser pior, como mostra a história moderna]. Ele preferirá então suas novas crenças [Osório diz: crenças não no sentido religioso (cuidado com os cacos!), mas no sentido de algo melhor. O que não implicará em nada de errado]. Para o Estado, suas leis e seus costumes são certos e louváveis enquanto forem impostos ou socialmente aprovados, mas o estadista pode persuadi-Io de que outros lhe seriam de mais vantagem. (A observação é feita explicitamente em 172a) [Osório diz: é isso mesmo! Qual o problema?]. Pena de morte, podemos dizer, é correta e apropriada enquanto tem apoio da opinião pública e é imposta legalmente. Se estas condições se alteram, é provável que seja porque antes uns poucos pensadores avançados (sophistai como o grego os poderia chamar) tiveram sucesso em difundir ideias diferentes; e só podem fazê-lo (segundo a teoria) convencendo os cidadãos de que a alteração será de vantagem prática (chreston) - de que, por exemplo, crimes de violência vão mais diminuir que aumentar. [Osório diz: É isso mesmo! Daí a importância do regime democrático!] Subjacente a esta argumentação tortuosa [Osório diz: tortuosa para quem?] está a convicção de Protágoras segundo a qual a dike existe para a preservação da ordem social, e que, portanto, a manutenção das leis existentes, embora não sejam as melhores, é justa e louvável porque as alternativas de desobediência e subversão destruiriam o "laço de amizade e união" de que nossa própria vida depende (Prot. 322c4). [Osório diz: fantástico isso! Não presta, mas ainda não tenho nada melhor. Mas isso não me impede de continuar tentando, antes de entregar a uma “estátua” ou a um pensamento o poder e o dever de me substituir em minha obrigação de procurar sempre o melhor!] Somente se forem sancionadas novas leis por consentimento comum e processos constitucionais é que a mudança pode ser para melhor [Refletindo sobre este assunto em linhas independentes, espero ter resolvido a dificuldade sentida e expressa por A. T. Cole em Yale. C. S. 1966, que o levou a concluir que a "Apologia de Protágoras" de Platão era de fato "não uma mas duas apologias", contendo respectivamente "uma concepção 'subjetivista' compatível com o princípio do homem como medida em 166d e uma 'utilitária' não assim compatível" (pp. 112 e 114s). Em particular não concordo que Platão tenha interpretado mal ou entendido mal a doutrina de 167a-b (p. 116). A afirmação de que 169d seja inconsistente não é verdade. Tudo o que aí diz Platão é que, de acordo com Protágoras, "alguns homens são superiores em assunto de melhor ou pior, e estes, disse ele, seriam sábios" (tradução de Cornford). Ele não diz que estes juízes melhores são os saudáveis em oposição aos doentes. São certamente os doutores (ou, em suas respectivas esferas, os agricultores, os oradores e os sofistas). [Osório diz: Guthrie “dá o couro à vara”!]]. [Osório diz: exatamente isso que pensa um democrata que se submete à lei. O que jamais seria possível para um Platão que quer e apoia a tirania, como fez em Siracusa].

(...)

Religião: teorias racionalistas: (a) agnosticismo e (b) ateísmo.

 

a) Crítica da religião tradicional:

 

Os filósofos pré-socráticos, quer admitissem, quer não a crença numa força ou em forças divinas, todos propagavam igualmente conceitos de religião que se afastavam muito do antropomorfismo [Osório diz: dá forma humana aos deuses] dos cultos populares ou estatais baseados no panteão [Osório diz: templo consagrado aos deuses por gregos e romanos] homérico. Xenófanes os atacava publicamente substituindo-os por um monoteísmo [Osório diz: monoteísmo entre os gregos] ou politeísmo não-antropomórfico. Outros os abandonavam tacitamente em favor, primeiro, de uma matéria sempre viva do mundo, descrita vagamente como governando ou dirigindo os movimentos do cosmo e de tudo o que ele contém, e, depois, em Anaxágoras, de uma Mente separada da matéria do universo sendo causa da ordem racional que ele manifesta.

Vimos Heráclito condenando oculto fálico [Osório diz: culto do pênis, que será retomado por Luciano de Samósata no século II da era atual] e outros cultos por causa de sua inconveniência, e Demócrito (sem dúvida sob a influência de teorias evolutivas já existentes [Osório diz: onde a prova? Suposição do autor, Guthrie]) afirmando que foi somente a natureza alarmante do trovão, relâmpago e fenômenos semelhantes que levou os homens a pensarem que eram causados pelos deuses. À medida que cresce a “ilustração” [Osório diz: a Sofística, ele, Guthrie, quer dizer!], manifesta-se sob dois aspectos principais (quer na Grécia antiga quer na Europa desde o Renascimento): em primeiro lugar a determinação de crer só no que é racional e a tendência a identificar a razão com o positivismo e o progresso da ciência natural [Osório diz: foi isso que Platão, com sua teologia, pôs a perder, já que voltou à superstição: crença em divindades!], e, em segundo lugar, o genuíno interesse pela moralidade. A moralidade identifica-se com a melhoria da vida humana e a eliminação da crueldade, injustiça e todas as formas de exploração dos seres humanos por seus companheiros, e baseia-se em padrões meramente humanístico e relativos, pois sustenta-se que padrões absolutos pretendendo autoridade sobrenatural não só levaram no passado [Osório diz: bem como no presente em que nasceu a Sofística, século V antes da era atual, e até depois, século IV, com os esctravocratas Platão e Aristóteles], mas também devem levar inevitavelmente, à crueldade, intolerância e outros males. Os deuses gregos eram muito vulneráveis nestes dois aspectos [Osório diz: os deuses porra nenhuma, mas os homens que os criaram e os usavam], e logo que a piedade convencional começou a se entregar a atitude mais pensativa – quando o nomos em todos os seus aspectos não mais se tomava como concedido, mas antes era contraposto ao que era natural e universal [A atitude convencional é exemplificada pela réplica de Sócrates em Xenofonte (Mem. 4.3.16) a Eutidemo, que reconhece a providência divina mas está preocupado com o pensamento de que não se pode dar nenhum retorno da parte dos homens aos deuses. Os deuses mesmos, diz ele, forneceram a resposta, pois sempre que o oráculo de Delfos se aproxima deste problema, replica: "Segue o nomos de tua cidade", o que significa propiciar aos deuses com sacrifícios na medida que está em teu poder [Osório diz: corrompe com agrado o teu deus?]. Tal resposta dificilmente satisfaria aos espíritos mais exigentes e interrogativos do séc. V. [Osório diz: no caso Guthrie dá “A César o que é de César”! Acho que chegou a passar mal com isso!]] [Osório diz: deus, que nunca foi, deixa de ser o legislador!] – o catolicismo [Osório diz: que ridículo Guthrie! Ainda mais por negar, depois, qualquer valos aos Sofistas, preferindo abraçar Platão e Aristóteles, os escravocratas!] e a desaprovação começaram a se fazer com crescente intensidade[Osório diz: mentira, pois Platão e Aristóteles são do século seguinte, o IV e, mesmo assim, continuam aprovando tudo isso!].

[Osório diz: alguns dos temas pelos quais, ou contra os quais, investiram os sofistas contra o meio social em que viveram: eliminação da crueldade e da injustiça e de todas as formas de exploração dos seres humanos por seus companheiros. É ou não um programa digno de louvor?].

O ataque à religião estava, com efeito, estreitamente ligado com a antítese nomos-physis. Platão (Leis 889e) queixa-se dos que afirmam que “os deuses são invenções humanas, não existem na natureza, mas apenas por costume e lei, que de mais a mais, diferem de lugar para lugar segundo o acordo feito por cada grupo quando estabeleceu suas leis”. Quando escreveu Platão, tais controvérsias não eram nada de novo [Osório diz: sim, ele que é do século IV, as apanha, no mínimo, no século V! De onde mais, Guthrie?]. O Sócrates de Aristófanes rejeitava os deuses como moeda fora da moda (nomisma, p. 58 acima), e, em Eurípides, Hécuba chama o nomos de superior aos deuses, porque é pelo nomos que nós cremos neles bem como em padrões de certo e errado. Há provas de sobra de que a influência da religião sobre as mentes dos homens enfraquecia-se no fermento intelectual da idade de Péricles, e também que o oficialismo ateniense estava nervoso e era sensível a isso. O culto dos deuses era parte integral da vida do Estado e uma poderosa força coercitiva [Osório diz: força coercitiva: manter os celerados amedrontados pelos castigos!]. Pode-se afirmar que tudo o que se fazia necessário era a conformidade com as práticas do culto, e que o pensamento era livre; mas deve ter sido tão óbvio para um ateniense tradicionalista como para o Cotta de Cícero que os que negam inteiramente a existência dos deuses “non modo superstitionem tollunt... sed etiam religionem, que deorum cultu pio continetur[Tradução: ] ... Daí os julgamentos de impiedade e decreto de Diopeithes contra o ateísmo e a especulação cósmica.

Eles nos toleravam [diz Plutarco (Nícias 23)] os filósofos naturais e os fitadores de estrelas [meteoroleschas, lit. "palradores sobre coisas do firmamento". A palavra ocorre em Platão (Rep. 489c), ligada com o adjetivo acherestous, para ilustrar o tipo de injúria que era dirigido aos filósofos. [Osório diz: aos filósofos! Pré-Socráticos e Sócrates! Pula-se sobre os Sofistas, que não eram filósofos, como tantas vezes diz Platão!]], como eles os chamavam, dissolvendo a divindade em causas irracionais, forças cegas e propriedades necessárias. Protágoras foi (p. 212) banido, Anaxágoras foi posto em embaraço e salvo com dificuldade por Péricles, e Sócrates, embora de fato não tivesse interesse por estes assuntos [Osório diz: como não se ele os conhecia e os discutia?], perdeu a vida pela devoção à filosofia.

E em sua vida de Péricles (32):

Por esta época [sc, pouco antes da Guerra do Peloponeso] Aspásia foi perseguida por impiedade... E Diopeithes [Não se conhece muito do que se designa com o nome próprio de Diopeithes. O nome é mencionado várias vezes em Aristófanes (Cavaleiros 1085, Vespas 380 Pássaros 988) mas tudo o que emerge é que o seu portador era adivinho. Fragmentos de outros poetas cômicos o pintam como fanático [Osório diz: como, de resto, são os religiosos!] e como tocador de tambor nos ritos coribânticos (Ameipsias 10 K., Teléclides 6 K e Frínico 9 K.; v. Lobeck, Aglaoph. 981). A perseguição de "Anaxágoras, o Sofista" é mencionada (mas não Diopeithes ou seu psephisma) por Diodoro (12.39.2). Para a conexão dos sofistas com os filósofos naturais [Osório diz: eis o que disse na nota anterior] cf. pp. 47ss, acima, e para a suposta conexão entre "contemplação do céu" e ensino sofista imoral Nuvens 1283 (pp. 109s).] introduziu uma denúncia para a cassação dos que negavam os deuses e ensinavam sobre fenômenos celestes, suspeitando de Péricles por causa de Anaxágoras. [Osório diz: o mesmo fará o catolicismo milênio depois! Galilleu].

A palavra sophistes aplicava-se naturalmente tanto a Anaxágoras como a Protágoras ou Hípias. [Osório diz: quando se aplica a Anaxágoras ela não é pejorativa, já quanto aos Sofistas... Pula-se sobre os Sofistas, que não eram filósofos, como tantas vezes diz Platão! Vai dos filósofos naturais a Sócrates, saltando, com vara, sobre os sofistas]

A crítica aos deuses por motivos morais veio cedo. Não era necessária nenhuma especulação científica ou subtileza lógica para escandalizar-se pela castração que Zeus aplicou em seu pai [Osório diz: É justo filho bater no pai? Zeus, que era deus, fez pior! Mas também cabe a pregunta: se o pai quer ser respeitado pelo filho, não deve também respeitá-lo?] e por seus muitos amores, pelos roubos e fraudes de Hermes, ou pela ciumeira de Hera e pelo caráter malicioso e vingativo dos imortais em geral. Mitos que apresentavam deuses como ladrões, adúlteros, sedutores e glutões já tinham sido rejeitados por Xenofonte e Píndaro. Na era da ilustração encontramos Eurípides por toda parte dando rédeas a esta crítica. Pode tomar diferentes formas – censura aos deuses por seu comportamento, declarações de que existem os deuses, mas não se comportaram nem podem se comportar desta maneira, ou afirmações de que, se assim são os deuses em que nos ensinam a crer, ou não existem – é tudo mentira – ou não se importam com os negócios humanos e não merecem nem precisam de nossa adoração. Como dramaturgo, Eurípides podia refletir todos os pontos de vista através de seus enredos e personagens [Osório diz: o mesmo vale para Platão]. No Íon, vemos a desilusão de um jovem, piedoso ministrante no templo, que fica sabendo que o deus a quem serve caiu na humilhação de seduzir uma mulher mortal. O Héracles contém veemente negação de que os deuses pudessem se comportar iniquamente (1341ss): [Osório diz: Por que o nome de Héracles era Héracles, já que tão próximo ao de Hera, sua madrasta e perseguidora?]

 

Não creio que os deuses tenham prazer em intercurso ilegal, nem pensei jamais nem posso ser persuadido de que oprimem uns aos outros com grilhões, nem que um seja senhor sobre o outro. Deus, se for verdadeiramente deus, não precisa de nada. São contos ignóbeis de bardos [Todavia era tão forte a forçada tradição que todo o enredo do Héracles depende da raiva de ciúme de Hera, de cuja crueldade inenarrável o próprio herói, que fala as palavras, foi vítima. Alguns pensaram que o paradoxo era deliberado, para manifestar o absurdo inerente da situação, mas Lesky (provavelmente com razão) vê-o como produto da tensão entre o assunto, imposto pela tradição e mitologia, e o intelecto do dramaturgo. V. Lesky, HGL, 382.]. [Osório diz: Essa prática de violência é comum no Velho testamento. / O interessantes é a desnecessidade sentida pelos deuses!]

 

Descrença total nos deuses, baseada na prosperidade dos maus e nos sofrimentos do justo, ganha voz em explosão apaixonada no Belerofonte. Não há deuses no céu. É insensatez crer em tais tagarelices. Basta que olhes ao teu redor. Tiranos matam, fraudam e saqueiam, e são mais felizes do que o piedoso e pacífico. Pequenos Estados tementes a deus são esmagados por força militar de Estados maiores e mais iníquos. Mais na tendência da passagem de Héracles está a linha, novamente de Belrofonte: “Se deuses agem ignobilmente, não há deuses”. Eurípides também enfatiza que se podia invocar o exemplo dos deuses para desculpar as falhas humanas, como, por exemplo, a velha ama de Fedra lhe desculpa a paixão ilícita lembrando-lhe, com exemplos de Zeus e Eos, que Afrodite é poder forte demais para os próprios deuses resistirem, e de novo, quando Helena se desculpa de sua própria conduta (Tro. 948). A mesma observação é feita com tendência cômica por Aristófanes, quando o Argumento Injusto afirma que, sem sua habilidade retórica, um pecador ficará perdido, mas com ele confundirá os seus acusadores (Nuvens 1079):

 

Supõe que és pego em adultério, tu argumentarás que não fizeste nada de errado, apontando para Zeus que nunca pôde resistir ao amor e a mulheres. Como, dirás, podes tu, um mortal, mostrar mais força do que um deus? [Osório diz: a relação dos sofistas com deus! Que religioso suportaria essa gente?].

 

Em contraste com o tradicionalismo rústico da ama, o moralista poderia afirmar que um deus podia ser mero produto de transferência psicológica: os homens dariam o nome a suas próprias paixões más [Osório diz: quem é o deus? A ama ou quem, podendo tudo, não impede a transferência psicológica?]. "Meu filho era belo", diz Hécuba a Helena (Eur. Tro. 987), "e à vista dele tua mente se tornou Cipre. Todos os atos insensatos são chamados de Afrodite pela humanidade”. Não se deve pensar, e não se pensava na época [Decharme (Critique, p. vii) apontou uma razão pela qual nenhuma suspeita de impiedade se ligava a esta purificação. … O fundamentalismo era fenômeno desconhecido aos gregos, porque não havia nada em sua literatura religiosa que correspondesse à “palavra de Deus”], que a crítica que tentava absolver os deuses do comportamento aético ligado a seus nomes nos mitos, era ataque à religião como tal, ou mesmo à religião estatal estabelecida. Um de seus mais vigorosos expoentes foi Platão, que na República acusou fortemente Homero e Hesíodo de mentira, todavia foi implacável opositor da descrença nos deuses e em seu cuidado providencial pela humanidade, e defensor dos cultos oficiais. [Osório diz: e aí Platão pôs todo o seu pensamento a perder!].

O pronunciamento de Antífon [sobre a divindade]: "Por esta razão ele não precisa de nada, nem espera alguma coisa de alguém, mas é infinito e auto-suficiente" [(a) Fr. 10. Com oudenos deitai de Antífon, cf. deitai gar ho theos... oudenos em Eurípedes. (b) Há tanta incerteza sobre a data dos escritos de Antífon (v. p. 265, n. 48, abaixo) que é impossível por razões externas dizer se Eurípedes copia ou não de Aletheia. Alguns usaram "ecos" de Antífon em Eurípedes como prova real de sua data, mas este é um critério perigoso. Afirmações como "Deus não carece de nada" podiam ser comuns a mais de um escritor do tempo, e nem Eurípedes nem Antífon precisam ser os primeiros a dizê-lo. [Osório diz: existem registros de outros dizendo isso? Se não tiver, o pioneirismo é de Antifonte sim!]]. [Osório diz: Deus é que é rico. Deus é que deve ajudar, não ser ajudado pelos pobres, por exemplo e diversamente do ocorre no mundo!].

A idéia que Platão deplorava, que “existem deuses, mas eles não se incomodam com os negócios humanos” (Leis 885b, 888c), era corrente no séc V. Xenofonte (Mem. 1.4.10) apresenta um homem chamado Aristodemo protestando a Sócrates, quando acusado de recusar dar aos deuses seu costumeiro galardão de sacrifício e prece, que, longe de desprezar o divino, ele pensava que o divino era grande demais para precisar de seu serviço, e, de mais a mais, que os deuses não podiam ter nenhuma atenção para com a humanidade. Diz-se que Antífon negou a providência na mesma obra Sobre a verdade em que declarou a auto-suficiência de Deus e falou da conveniência de se conformar com a moralidade convencional somente quando sob observação; e Trasímaco viu na prevalência da maldade uma prova de que os deuses são cegos ao que se passa entre os homens. [Osório diz: que religião não desejaria apagar tais pensamentos?].

O racionalismo dos filósofos naturais não era totalmente ateísta (como usaríamos a palavra), mas não obstante destrutivo do panteão tradicional e oficial. Na tradição jônica, a divindade, por longo tempo, foi identificada com a physis viva do mundo, até que Anaxágoras a separou como Mente remota que começou o processo cósmico no início. Mais importante do que a existência desta Mente era, para seus contemporâneos, a redução do Hélios onividente, que atravessava o firmamento todo dia em sua carruagem de luz e era a terrível testemunha dos juramentos mais sagrados dos homens, ao estado de uma massa de pedra incandescente informe e sem vida. [Osório diz: a desmitificação da divindade. Hélio, o sol, deixou de ser um deus (mente remoa que começou o processo cósmico) para transformar-se naquilo que é: uma pedra!].

Eurípedes (…) é como espelho de seu tempo que ele (para nossos presentes objetivos) é mais bem considerado. [Osório diz: por isso, Aristófanes também deve sê-lo!].

[Osório diz: Platão tentou, com seu Sócrates, fazer o argumento fraco (o dele) transformar-se em forte? Sim! Quando ele não tinha mais racionalidade para apelar, ele apelou para o invisível, deus!].

Quem não lança longe de si os embustes dos fitadores de estrelas, cujas línguas nocivas, vazias de bom senso, balbuciam a esmo assuntos desconhecidos?” Pesquisa desorientada dos segredos da natureza levou alguns ao ateísmo, mas para o homem sábio o kosmos intertemporal, que ela revela só pode levar à conclusão que há deus, ordenador inteligente, em ou atrás dela. [Osório diz: isso é crença, não explicação. Não é racionalidade].

Astrônomos (diz Platão) receberam o nome de ateus porque alguns dos primeiros pensavam que os corpos celestes eram apenas massas mortas girando por necessidade. Mas mesmo entre estes as mentes mais ousadas suspeitaram que seus movimentos perfeitamente calculados não podiam ser realizados sem inteligência, e decidiram que, embora as próprias estrelas pudessem ser torrões e pedras sem vida, havia uma mente atrás delas dirigindo seus movimentos em toda a ordem cósmica. [Osório diz: mas qual mende? Onde está? Suposição?]

 

Agnosticismo: Protágoras.

 

Segundo Diógenes Laércio (9.24), o filósofo eleata Melisso disse que era errado fazer qualquer pronunciamento sobre os deuses porque era impossível o seu conhecimento. Mas o caso clássico de agnóstico neste século é o seu contemporâneo Protágoras, que ficou famoso por ter escrito:

 

Quanto aos deuses, sou incapaz de descobrir se existem ou não, ou que forma têm; pois há muitos empecilhos para o conhecimento, a obscuridade do assunto e a brevidade da vida humana. [Osório diz: o cara confessa uma fraqueza sincera (o desconhecimento) e é condenado? Deveria ele mentir, como faz Platão? Aliás, mentir sobre deus é a melhor coisa, pois é impossível provar a mentira na forma que se requer!]

 

A forma da afirmação é de uma opinião pessoal (“Sou incapaz...") e contrasta significativamente com uma expressão como a de Xenófanes (fr. 34) de que nenhum homem viu, e nenhum homem também nunca saberá a verdade sobre os deuses [Osório diz: Protágoras não fecha portas! Não diz que o tema deva ser encerrado. Não o dá por findo para o homem, apenas para ele próprio, Protágoras]. Alguns acreditavam nos deuses e outros não, e, sendo assim, de acordo com o princípio "o homem é a medida", os deuses existiam para alguns e não para outros; mas para o próprio Protágoras a suspensão de juízo era a única maneira possível [Isto se acomoda satisfatoriamente coma alegação de T. Gomperz (GT, 1, 457) de que se Protágoras cresse, como Platão disse que cria, que "toda a verdade de um homem é a verdade que lhe parece", ele não poderia ter dito o que disse sobre os deuses. [Osório diz: claro que poderia. Uma coisa não exclui outra! Para ele, Protágoras era assim. Isso não impedia que para outro fosse diferente! Mas, daí seu gênio: um poderia convencer o outro de sua tese! Ess Gomperz, tanto pai quanto filho são dois fanáticos!]]. [Osório diz: isso mesmo! Enfim o autor, Guthrie, reconhece o que deveria ser do conhecimento de todos! Protágoras jamais proibiu, até porque nem poderia, a crença nos deuses, mas a entregou a cada qual!]

Protágoras (…) defendeu o culto religioso segundo os nomoi antepassados. (Fonte: Os sofistas, W. K. C. Guthrie, tradução, João Rezende Costa, Paulus, São Paulo, 1995, p. 155-165, 211-218).

 

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