Sofística
(uma biografia do conhecimento)
30 – Matérias estudadas pelos Sofistas.
O que veio acima é uma pregustação dos tópicos, de cálido interesse nos tempos em que Sócrates vivia, que serão examinados em capítulos posteriores: o status das leis e dos princípios morais, a teoria do progresso do homem da selvageria para a civilização substituindo a teoria de degeneração de uma idade áurea passada, a ideia do pacto social, teorias subjetivas do conhecimento, ateísmo e agnosticismo, hedonismo e utilitarismo, a unidade do gênero humano, escravidão e igualdade, a natureza da arete, a importância da retórica e o estudo da linguagem.(p. 29) [Osório diz: o que propunham os sofistas!].
São eles:
(i) o status das leis e dos princípios morais,
(ii) a teoria do progresso do homem da selvageria para a civilização substituindo a teoria de degeneração de uma idade áurea passada,
(iii) a ideia do pacto social,
(iv) teorias subjetivas do conhecimento,
(v) ateísmo e agnosticismo,
(vi) hedonismo e utilitarismo,
(vii) a unidade do gênero humano,
(viii) escravidão e igualdade,
(ix) a natureza da arete,
(x) a importância da retórica,
(xi) o estudo da linguagem.
“Que tinha algo de que se gabar também é certo. Platão fala de sua memória prodigiosa, pela qual podia reter uma lista de cinquenta nomes depois de uma só lida, e sua extraordinária versatilidade. Bem o pôde chamar Xenofonte de polímata. Era evidentemente alguém que absorvia aprendizado fácil e rapidamente, o que exigia dons altamente intelectuais em alguns aspectos. Assuntos que estava preparado para ensinar incluíam astronomia, geometria, aritmética, gramática, ritmo, música, genealogia, mitologia e história, inclusive história da filosofia, e matemática. Também escreveu declamações sobre os poetas.” [Osório diz: temas sobre os quais estudaram os sofistas]
[Osório diz: existem tais homens na atualidade? Existem uns com mente fotográfica, como no filme “Rain man”, mas tem problemas mentais gravíssimos! O que parecia não ser o caso de Hípias]. (Fonte: Os sofistas, W. K. C. Guthrie, tradução, João Rezende Costa, Paulus, São Paulo, 1995, p. 29 e 261).
Kerferd ensina:
“A modernidade da extensão dos problemas formulados e discutidos pelos sofistas no seu ensino é realmente espantosa e a lista que se segue fala por si mesma. Primeiro, problemas filosóficos na teoria do conhecimento e da percepção — em que grau as percepções sensíveis devem ser consideradas infalíveis e incorrigíveis, e os problemas decorrentes nesse caso. A natureza da verdade e, acima de tudo, a relação entre o que parece ser e o que é real ou verdadeiro. A relação entre linguagem, pensamento e realidade. Depois, a sociologia do conhecimento, que reclama por investigação, porque muito do que supomos conhecer parece ser socialmente, na verdade etnicamente, condicionado. Isso abriu, pela primeira vez, o caminho para a possibilidade de uma abordagem genuinamente histórica da compreensão da cultura humana, sobretudo mediante o conceito do que foi chamado "antiprimitivismo", isto é, a rejeição da visão de que as coisas eram muito melhores no passado distante, em favor da crença no progresso e da idéia de um constante desenvolvimento na história dos seres humanos. O problema de se alcançar qualquer conhecimento a respeito dos deuses, e a possibilidade de que os deuses existam apenas em nossas mentes, ou até que sejam invenções humanas necessárias para servir às necessidades sociais. Os problemas teóricos e práticos da vida em sociedade, sobretudo nas democracias e sua doutrina implícita de que pelo menos sob alguns aspectos todos os homens são ou devem ser iguais. O que é justiça? Qual deveria ser a atitude dos indivíduos quanto aos valores impostos por outros, sobretudo numa sociedade organizada que requer obediência às leis e ao Estado? O problema do castigo. Natureza e finalidade da educação e o papel dos professores na sociedade. As ruinosas implicações da doutrina segundo a qual virtude pode ser ensinada, o que é apenas uma maneira de expressar, em linguagem fora de moda, o que queremos dizer quando afirmamos que pela educação as pessoas podem mudar a sua situação na sociedade. Isso, por sua vez, levanta de forma aguda a questão do que deve ser ensinado, por quem e a quem deve ser ensinado. O efeito de tudo isso na geração mais jovem em relação à mais velha. Como conseqüência de tudo isso, dois temas dominantes — a necessidade de aceitar o relativismo nos valores e noutras coisas, sem reduzir tudo ao subjetivismo, e a crença de que não há área da vida humana, ou do mundo como um todo, que seja imune à compreensão alcançada por meio do debate racional.” [Osório diz: Temas estudados pelos sofistas] (Fonte: O movimento sofista, G. B. Kerferd, tradução de Margarida Oliva, Loyola, São Paulo, 2003, p. 10 a 12).
É ainda o mesmo autor quem expõe:
“a) problemas filosóficos na teoria do conhecimento e da percepção — em que grau as percepções sensíveis devem ser consideradas infalíveis e incorrigíveis, e os problemas decorrentes nesse caso.
b) A natureza da verdade e, acima de tudo, a relação entre o que parece ser e o que é real ou verdadeiro.
c) A relação entre linguagem, pensamento e realidade.
d) Depois, a sociologia do conhecimento, que reclama por investigação, porque muito do que supomos conhecer parece ser socialmente, na verdade etnicamente, condicionado. Isso abriu, pela primeira vez, o caminho para a possibilidade de uma abordagem genuinamente histórica da compreensão da cultura humana, sobretudo mediante o conceito do que foi chamado "antiprimitivismo", isto é, a rejeição da visão de que as coisas eram muito melhores no passado distante, em favor da crença no progresso e da idéia de um constante desenvolvimento na história dos seres humanos.
e) O problema de se alcançar qualquer conhecimento a respeito dos deuses, e a possibilidade de que os deuses existam apenas em nossas mentes, ou até que sejam invenções humanas necessárias para servir às necessidades sociais.
f) Os problemas teóricos e práticos da vida em sociedade, sobretudo nas democracias e sua doutrina implícita de que pelo menos sob alguns aspectos todos os homens são ou devem ser iguais.
g) O que é justiça?
h) Qual deveria ser a atitude dos indivíduos quanto aos valores impostos por outros, sobretudo numa sociedade organizada que requer obediência às leis e ao Estado?
i) O problema do castigo.
j) Natureza e finalidade da educação e o papel dos professores na sociedade.
l) As ruinosas implicações da doutrina segundo a qual virtude pode ser ensinada, o que é apenas uma maneira de expressar, em linguagem fora de moda, o que queremos dizer quando afirmamos que pela educação as pessoas podem mudar a sua situação na sociedade.
m) Isso, por sua vez, levanta de forma aguda a questão do que deve ser ensinado, por quem e a quem deve ser ensinado.
n) O efeito de tudo isso na geração mais jovem em relação à mais velha.
o) Como consequência de tudo isso, dois temas dominantes — a necessidade de aceitar o relativismo nos valores e noutras coisas, sem reduzir tudo ao subjetivismo,
p) e a crença de que não há área da vida humana, ou do mundo como um todo, que seja imume à compreensão alcançada por meio do debate racional.”.
É relevante, aqui, a passagem no Sofista de Platão (232b 11-e2), mencionada anteriormente, onde, depois de sugerir que o sofista se caracteriza por ser um antilogikos, o Estrangeiro Eleático pergunta qual é a série de tópicos com os quais essas pessoas se ocupavam, e ele mesmo responde com uma lista: coisas divinas na maioria invisíveis, objetos visíveis na terra e no céu, a vinda à existência e o ser de todas as coisas, leis e todas as questões de política, cada uma das artes (techné), e insiste que tudo isso não era discutido somente por Protágoras, em seus escritos, mas por muitos outros também. [Osório diz: o que estudavam os sofistas].
Isso nos fornece uma lista extensa de tópicos incluindo um título inesperado, coisas divinas. Mas é aqui que se deveria colocar o livro de Protágoras, Sobre os deuses, cujas palavras iniciais nos dão uma aplicação da doutrina dos dois argumentos opostos: "concernente aos deuses não posso vir a conhecer nem como são eles, nem como não são ou que aparência têm"; e também a obra Sobre as coisas no Hades. Pródicos (DK 34B5) discutiu a origem da crença dos homens em deuses em termos naturalistas e psicológicos, e Crítias (DK sustentava que os deuses foram inventados deliberadamente pelos governantes para garantir o bom comportamento de seus súditos.” [Osório diz: frases e pensamentos dos sofistas sobre os deuses]. (Fonte: O movimento sofista, G. B. Kerferd, tradução de Margarida Oliva, Loyola, São Paulo, 2003, p. 10-11, 71).
Prossegue Kerferd:
“É provável que a importância histórica e intelectual dos sofistas seja agora mais geralmente reconhecida do que era antes. É indiscutível que eles ensinaram e discutiram gramática, teoria linguística, doutrinas filosóficas e morais, doutrinas sobre os deuses e a natureza e a origem do homem, crítica e análise literária, matemática e, pelo menos em alguns casos, os elementos da teoria física sobre o universo [Osório diz: o que discutiram os Sofistas?]. Mas eram eles filósofos? Isso ainda não é geralmente admitido. Depende, em parte, da definição de filosofia. Aqui o fantasma do platonismo ainda está ativo. Para Platão, os sofistas rejeitavam o que ele considerava ser a realidade última e estavam tentando explicar o universo em termos de seus aspectos fenomenais apenas. Para Platão, o mundo fenomenal era um mundo falso, sem realidade e, portanto, sem o requisito essencial para ser um genuíno objeto de conhecimento. Mas no mundo moderno, onde os especialistas, na maioria, não são platônicos e, de modo geral, nem mesmo querem procurar a realidade na direção em que Platão acreditava que ela devia ser encontrada, é algo paradoxal que a condenação platônica ainda permaneça em grande parte indiscutível. Já vai longe o tempo em que a rejeição de qualquer realidade transcendente podia ser tomada como indício de que a busca da verdade fora abandonada.” [Osório diz: Platão e a modernidade! / O problema, creio eu, ainda é de financiamento: as religiões continuam “bancando” a educação e, consequentemente, as pesquisas, além de condenando!]. (Fonte: O movimento sofista, G. B. Kerferd, tradução de Margarida Oliva, Loyola, São Paulo, 2003, p. 294-295).