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24.5 – Platão e as ideias de Protágoras que ele se apropriou (plagiário?).

Sofística

(uma biografia do conhecimento)

 

24.5 – Platão e as ideias de Protágoras que ele se apropriou (plagiário?).

 

Kerferd ensina:

 

Finalmente, literatura. Aqui temos notícia de Protágoras dizendo (Prot. 338e6-339a3) que, na sua opinião, a maior parte da educação de um homem consiste em ser perito em assunto de versos, isto é, ser capaz de entender, na fala dos poetas, o que foi correta ou incorretamente composto, saber como distingui-los e comentá-los quando solicitado [Osório diz: justamente a repetição de que falará Sócrates]. E prossegue introduzindo uma elaborada discussão de um poema por Simônides; esta, por sua vez, provoca novas análises por Sócrates e Pródicos, e a proposta de uma exposição por Hípias, que é rapidamente recusada por causa de uma reunião presidida por Alcibíades, com a solicitação de que a faça numa outra ocasião. Que a exposição rejeitada de Hípias poderia ter sido enfadonha é sugerido pelas referências às suas epideixis sobre Homero e outros poetas, no Hípias Menor 363 al-c3. A discussão toda, no Protágoras, ocupa mais ou menos um sexto do diálogo completo; e sabemos, por um fragmento de papiro que Protágoras de fato comprazia-se na crítica literária de Homero (DK 80A30). Um pouco mais tarde, Isócrates (XII, 18) conta como certa vez, no Liceu, três ou quatro sofistas, simples e comuns, estavam sentados discutindo poetas, especialmente Hesíodo e Homero. É claro que a prática seguida por Protágoras continuou por muito tempo depois. [Osório diz: Protágoras e a crítica literária]. (Fonte: O movimento sofista, G. B. Kerferd, tradução de Margarida Oliva, Loyola, São Paulo, 2003, p. 72).

 

Acrescenta Kerferd:

 

Após uma minuciosa crítica do esquema platônico, Aristóteles afirma, em Política II, 7, que inúmeros outros esquemas constitucionais tinham sido propostos por particulares, por filósofos e por estadistas. Mas são todos menos radicais do que o de Platão e nenhum tinha introduzido a proposta revolucionária de comunidade de esposas e filhos, ou de refeições em comum para as mulheres. Com base nessa afirmação, pensa-se, às vezes, que Platão inventou e elaborou, sozinho, o esquema todo. Entretanto, ele tinha sido antecipado, no mínimo, em alguns detalhes. Heródoto (IV, 104) tinha relatado que o cita Agatirsiano praticara uma espécie de comunidade de mulheres a fim de que os homens pudessem ser irmãos entre si e, sendo todos quase aparentados, não sentissem inveja ou rancor um do outro. Eurípides, no seu Protesílaos (fr. 653N), tinha se referido a algo semelhante, e o próprio Aristóteles (Política 1262a19) reporta-se a uma prática do mesmo tipo na Líbia Superior. Isso deixa claro que a idéia era conhecida, e tinha despertado interesse bem antes que Platão produzisse a República. [Osório diz: Platão plagiário!]

As semelhanças com o que Platão diz na República são realmente notáveis, e não só é possível como também bastante provável que Platão conhecesse a peça na época em que estava escrevendo a República. A única alternativa plausível é a de uma fonte escrita para ambas as composições. Mas se essa fonte tivesse existido é estranho que ninguém, na Antiguidade, parece tê-la mencionado, fora a declaração geral de que Platão tirara o conteúdo da República do Antilógica de Protágoras. É, por conseguinte, muito provável que as semelhanças verbais devam ser explicadas pelo uso da peça de Aristófanes por Platão. Mas não é provável que o programa todo fosse algo simplesmente inventado por Aristófanes. Por causa do crivo acidental e altamente seletivo através do qual a literatura do século V teve de passar antes de se tornar acessível a nós, há constante perigo de se subestimar o vigor e a extensão das contínuas discussões, escritas e não-escritas, travadas sobre assuntos de interesse público. Embora não se possa fazer atribuições pessoais, pode-se ter como virtualmente certo que teorias revolucionárias sobre os direitos e a posição das mulheres estavam no ar durante o tempo de vida de Aristófanes. Senão ele não teria dedicado pelo menos três comédias a tais questões, a saber, Lisístrata, Thesmophoriazusae (As celebrantes das Tesmofôrias) e Assembleia das Mulheres [Osório diz: é o que digo sobre o gasto de tinta sobre os Sofistas por Platão e Aristóteles]. Exatamente o que estava na mente de muitas pessoas pode ser claramente depreendido do elaborado relato das desvantagens que afligiam as mulheres na primeira fala de Medeia, na peça de Eurípedes (Medeia, 230-266). Ela começa com a declaração de que ter que comprar um marido é bastante ruim: ser sua escrava física é pior ainda [Osório diz: que frase magnífica!]. Aqui, como já foi dito, "ela contrasta as condições físicas e sociais da existência das mulheres com a liberdade usufruída pelos homens. Um complemento desse relato das condições presentes é suprido pela visão confiante, na primeira estrofe e antístrofe do coro seguinte. Uma mudança vem vindo, o futuro será melhor" (410-430). Tudo isso tem seu lugar na história da própria peça. Mas dificilmente teria sido possível que um auditório escutasse o que estava sendo dito sem também estar consciente de suas implicações maiores. [Osório diz: daí o Sócrates de As nuvens e As rãs ser o Sócrates de todos conhecido! Entretanto, poucos autores falam do Sócrates d'As rãs!]. (Fonte: O movimento sofista, G. B. Kerferd, tradução de Margarida Oliva, Loyola, São Paulo, 2003, p. 272, 274-276).

 

Diz ainda Kerferd:

 

Platão como plagiário de Protágoras.

 

Qual é, então, a importância disso? Nem é preciso dizer que ninguém, nos tempos modernos, acreditou por um só instante na verdade literal da alegação. Faz parte de uma série de acusações de plágio dirigidas a Platão por críticos hostis, e muitos se satisfazem com simplesmente ignorá-las como uma invenção maldosa. Entretanto, por mais maldosa que tenha sido a acusação, ela só poderia ter sido feita se houvesse pelo menos alguma base para comparação, por superficial que fosse. Em outras palavras é sinal de que Protágoras tratou pelo menos alguns dos temas que interessavam a Platão na República [Osório diz: isso me leva a afirmar que, a despeito do que diz Romilly para a não preservação dos escritos dos sofistas (não tinham eles discípulos para os continuarem e assim, os preservarem), os maiores discípulos dos sofistas foram, justamente, Platão e Aristóteles!]. Naturalmente, este é o ponto em que começam as especulações. Possivelmente Protágoras tinha esboçado a sua própria versão do Estado ideal, ou pelo menos alguma coisa paralela ao primeiro estágio do Estado ideal de Platão, a "Cidade dos Porcos" na República, Livro II. Outros pensaram na emancipação das mulheres, na República, como alguma coisa que podia ter sido antecipada por Protágoras. Isso não é refutado pela declaração, na Política de Aristóteles (1266a34ss, cf 1274b9-ll), de que nenhum outro pensador, além de Platão, tinha proposto novidades tais como a comunidade de esposas e crianças, ou refeições comuns para as mulheres. Porque Aristófanes, como veremos, já tinha tentado ridicularizar o que devia equivaler a uma espécie de Movimento em prol dos Direitos das Mulheres que já era conhecido, em Atenas, no século V. Na ausência de outros testemunhos, é simplesmente impossível dizer quais poderiam ter sido os temas realmente tratados por Protágoras. Mas é provável que fossem importantes e não estivessem simplesmente limitados à aplicação do princípio dos dois-logoi aos assuntos políticos. [Osório diz: Não se deve esquecer, também, que quando Platão escreveu seus diálogos, as Leis de Túrios, dadas por Protágoras, podiam por ele ser consultadas!]

As semelhanças com o que Platão diz na República são realmente notáveis, e não só é possível como também bastante provável que Platão conhecesse a peça na época em que estava escrevendo a República. A única alternativa plausível é a de uma fonte escrita para ambas as composições. Mas se essa fonte tivesse existido é estranho que ninguém, na Antiguidade, parece tê-la mencionado, fora a declaração geral de que Platão tirara o conteúdo da República do Antilógica de Protágoras. É, por conseguinte, muito provável que as semelhanças verbais devam ser explicadas pelo uso da peça de Aristófanes por Platão. Mas não é provável que o programa todo fosse algo simplesmente inventado por Aristófanes. Por causa do crivo acidental e altamente seletivo através do qual a literatura do século V teve de passar antes de se tornar acessível a nós, há constante perigo de se subestimar o vigor e a extensão das contínuas discussões, escritas e não-escritas, travadas sobre assuntos de interesse público. Embora não se possa fazer atribuições pessoais, pode-se ter como virtualmente certo que teorias revolucionárias sobre os direitos e a posição das mulheres estavam no ar durante o tempo de vida de Aristófanes. Senão ele não teria dedicado pelo menos três comédias a tais questões, a saber, Lisístrata, Thesmophoriazusae (As celebrantes das Tesmofôrias) e Assembleia das Mulheres [Osório diz: é o que digo sobre o gasto de tinta sobre os Sofistas por Platão e Aristóteles]. Exatamente o que estava na mente de muitas pessoas pode ser claramente depreendido do elaborado relato das desvantagens que afligiam as mulheres na primeira fala de Medeia, na peça de Eurípedes (Medeia, 230-266). Ela começa com a declaração de que ter que comprar um marido é bastante ruim: ser sua escrava física é pior ainda [Osório diz: que frase magnífica!]. Aqui, como já foi dito, "ela contrasta as condições físicas e sociais da existência das mulheres com a liberdade usufruída pelos homens. Um complemento desse relato das condições presentes é suprido pela visão confiante, na primeira estrofe e antístrofe do coro seguinte. Uma mudança vem vindo, o futuro será melhor" (410-430). Tudo isso tem seu lugar na história da própria peça. Mas dificilmente teria sido possível que um auditório escutasse o que estava sendo dito sem também estar consciente de suas implicações maiores. [Osório diz: daí o Sócrates de As nuvens e As rãs ser o Sócrates de todos conhecido! Entretanto, poucos autores falam do Sócrates d'As rãs!]. (Fonte: O movimento sofista, G. B. Kerferd, tradução de Margarida Oliva, Loyola, São Paulo, 2003, p. 237-234, 275-276).

 

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