Livros que Li

Você está aqui: Home | Livros | Livros que Li

As coisas simpáticas da vida - Felipe Peixoto Braga Netto

Caro Felipe Peixoto Braga Netto, ou Felipe Peixoto,

Acabo de ler o seu livro “As coisas simpáticas da vida”, Editora Landy, o qual foi recomendado pela nossa colega Cibele Guedes. Concomitantemente, li, também, o livro “Viver para contar”, do seu colega escritor Gabriel García Márquez. Este último li por ter sido receitado pela nossa colega Geisa de Assis Rodrigues.
Sem me cansar de um ou de outro, depois de calcular um determinado número de páginas de cada uma das obras que permitisse terminar a leitura das duas simultaneamente, trocava um pelo outro e seguia em frente. Certo é que venci as 198 páginas dos seus belos escritos e as 474 dos escritos do Gabo.



Para demonstrar que li, em especial o seu livro, e, assim, atiçar a curiosidade de alguém que possa ler este escrito, gostaria de conversar contigo sobre alguns assuntos que trazes nas tuas crônicas. Vamos a eles:

Você diz:

“Eu tive uma namorada que dizia que sua virgindade era uma presunção absoluta, ‘juris et de jure’. Se eu soubesse o que era isso na época, seria fácil desmenti-la”.    

És de 1973 (2005-1973), tens 33 anos, eu tenho só 10... a mais. Logo, posso ponderar: será que é útil e cavalheiresco desmentir uma mulher (uma dama), especialmente neste assunto?
O mal (consequentemente, a mentira) por si se destrói, não é isso? Não vale a pena desmenti-la.

Como gostas de música, e não tens preconceito, o Julio Iglesias tem uma música (“A mis 33 años”) em que ele diz que 33 anos é “nada mais, só meia vida, 33 anos, que se vão com tanta pressa”.

Infelizmente já passei da metade, felizmente, aprendi o que ora te digo, embora com as escusas de sempre.

Entretanto, para dama que fala que “sua virgindade era uma presunção absoluta, ‘juris et de jure’”, a fórmula lingüística do convite que fazes é merecida, espetacular:

“Com efeito, conspícua e ditosa dama, digne-se a desnudar-se, para que juntos, em carnal conúbio, possamos vislumbrar os gozos infindos do céu, em inconcussa ventura”.

Isso me lembrou algo que ouvi de um estagiário da PR-SP, o qual, ao falar com sua namorada, que também era estudante de Direito, disse:

“Fulana, vamos ter que postergar o nosso encontro”!

É o mundo do Direito se incentivando a permanecer sempre desconhecido, e, assim, por não compreendido, mas falado difícil, pensado impoluto e importante.
Sigamos adiante.

“Enorme injustiça do destino. Os seres femininos, essas criaturas levianas, escolhem seus pares entre os dançarinos. E aí, os privados de valsa, os ausentes de molejo, vão para a lata de lixo afetiva. Ficam lá, esquecidos, bolando planos de vingança contra os pés de valsa. A mulherada quer é suar, quer é aproveitar o gingado bom do passo colado. E estarão erradas? Eu só acho que sim porque estou de fora”.

Isso é o que se chama concordar em gênero, número e grau.

Somos companheiros de infortúnio, caro Felipe. Vamos nos queixar para o Lupicínio Rodrigues :“O cabaré se inflama quando ela dança, e com a mesma esperança, todos lhe põem um olhar, e eu o dono, aqui no meu abandono, espero morto de sono, o cabaré...”.

Pena que não somos donos.

Ao nos contar sobre o teu cachorro, dizes:

“Mas é isso: sua grande paixão é minha mãe. Eu, já faz tempo, fui rebaixado ao posto de segundo amor. Gosta de mim; ama minha mãe. Seu bem querer por mim é, digamos, um tanto condicional. Se passo um tempo sem levá-lo ao mar, ou brincar com sua onipresente bolinha azul, fica um pouco frio. Se bem que frio ele não é. É, não é. Digamos que ele redireciona seus carinhos para alguém cujas retribuições sejam mais promissoras”.

Vamos com calma, meu excelente cronista:  MAR em Minas Gerais? Só se for em Guarapari, que, por sinal, só é mar de mineiro pela ocupação.

Depois voltaremos a este assunto.

“Só não me peçam para definir Minas. E como a velha frase de Santo Agostinho sobre o amor: se não me perguntam o que é, sei. Se me perguntam, já não sei”.

Só para nós dois: nunca li o tal Santo. Por favor, não espalha.

Daí minha ignorância. É que certa vez, um professor, na mesma frase, em vez de “amor”, usou “tempo”. Essa é uma daquelas frases que podem ser adaptadas a qualquer ocasião? Quem está com a razão? Eu jogo todas minhas fichas no romântico Felipe, a despeito do Agostinho não ser fraco não! Não foi ele que disse: "Senhor, me ajude a ser puro, mas não agora!"? O garoto foi danadinho.

Estaria eu enganado ou você está apaixonado por Minas Gerais? A paixão tem os seus inconvenientes – todos muito salutares, penso eu. Seria essa paixão a razão de só ver virtude em tudo que é de e em Minas? Sendo você um mineiro adotado e mais mineiro que muitos mineiros quando decantam as Alterosas, não me leve a mal, já que não conheço essas plagas o suficiente, logo não posso concordar ou discordar de você. Por isso, nesse tema – Minas Gerais –, apenas pergunto, jamais afirmo.

Vamos adiante.

Por que confessas o que não é verdade?! Dizes:

“Mas essa não é uma crônica sobre a Juliana. Já tenho escrito tanto sobre ela”.

Onde? Quando?

Quando disseste sobre a Juliana, passei a ler com atenção redobrada, pois, pelo talento do escritor, pensei que iria encontrar algo superior a “As mãos de Eurídice”, do Pedro Bloch. Ledo engano Ivo!

Presumi: se as mãos da Eurídice já eram tudo aquilo, imagine o que não será a Juliana numa crônica do Felipe.

É meu caro, fiquei na ilusão de conhecer os dotes e beleza da Juliana, já que, depois desta mísera citação, ela foi esquecida para todo e sempre no restante do livro.

Mesmo triste, concluí: o Felipe não é tolo não, cita o santo (ou melhor, a santa), mas não confessa o milagre. Tá certo, vai entregar o ouro (e Minas já diz tudo quanto a esse metal) aos bandidos?

Informas:

“O mineiro, conformado porque é o jeito, agora deu para zombar do mar. Li, dia desses, em camiseta, a seguinte frase: "Eu tenho pena do mar, porque ele não banha Minas".

Minas certamente tem muitas coisas, como dizes, mas, dentre essas muitas coisas, existem muitas dessas camisetas, pois numa das viagens que fiz a Belo Horizonte, também li a mesma frase, e, por coincidência, numa camiseta!

Fiquei em dúvidas quando afirmaste:

“E também porque pega mal ir à praça e proclamar, em alto som, secretas virtudes do coração. Em mesa de bar também não digo, só mal e pouco, porque, puxa, não é certo dizer a quantas anda a nossa alma assim, como quem pede a conta. Enfim, só sei chorar minhas mágoas escrevendo, o leitor agüente, se tiver bom coração”.

Será? Lembras do Ricupero (“o que é bom a gente diz, o que é ruim a gente esconde”)? Se é virtude, mesmo sendo do coração, será que não é melhor dizê-la, mesmo que no coreto da praça?

Se é em mesa de bar, então...

Como você sabe tudo de música, lembra do Rossi, o Reginaldo? Ele não disse: “aqui nesta mesa de bar, você já cansou de escutar, centenas de casos de amor...”?

Pois é, mesa de bar escuta tudo, e o pior, com grande respeito ao sofrimento dos outros, já que não critica, a tudo ouve calada, num verdadeiro temor reverencial.

Aproveito para, imprudentemente, te apresentar o Sérgio Souto, um acreano que sabe reverenciar uma mesa de bar. Diz ele:

“Puxa a cadeira e senta conversa com um velho amigo
A muito tempo preciso contar todo o meu castigo
Mas veja que graça a dor estampada em meu rosto
E a sombra da noite que hoje me servem de encosto
 
Senta eu explico tudo o que a vida me fez
As vezes nem quero pensar mas me fica o talvez
Veja que eu aparento bem mais uns dez anos
E as mágoas do tempo acabaram com todos os meus planos
 
Agora a lua está boa para se cantar pega o violão
Dedilha um samba enquanto eu afino o coração
Te juro não olho pro nome dela gravado na mesa
E deixa um segundo a alegria enganar a tristeza
 
Desce mais uma cerveja bem gelada seu garção (?)
Que essa rodada é por conta da casa do patrão
Eu hoje só tenho uns amigos de bar
E deixo essa falsa alegria a tristeza enganar
 
Agora a lua está boa para se cantar pega o violão
Dedilha um samba enquanto eu afino o coração
Te juro não olho pro nome dela gravado na mesa
E deixa um segundo a alegria enganar a tristeza
 
Desce mais uma cerveja bem gelada seu garção (?)
Que essa rodada é por conta da casa do patrão
Eu hoje só tenho uns amigos de bar
E deixo essa falsa alegria a tristeza enganar”.

Ele chama esse hino de “Falsa Alegria”!

Eu ia te perguntar, pois também já tinha ouvido-a, quem é o autor da frase que originou: “Nossas opiniões são elas e suas circunstâncias”, mas, dia desses, escutando as lições dos mestre João Bosco Araújo Fontes Júnior (seu vizinho de Estado natal) e José Pedro Taques, testemunhei que um atribui ao outro, e vice-versa, a condição de pupilo do Ortega y Gasset, repetindo a sua famosa frase, daí resolvi poupá-lo da impertinente inquirição.

Você é um incentivador do descaramento, meu caro Felipe, pois repete Shakespeare em duas oportunidades. Eis a preciosidade de ensinamento:

'Não passam de traidoras nossas dúvidas, que às vezes nos privam do que seria nosso se não tivéssemos o receio de tentar".

Com esse incentivo, eu, que já era meio arriscador, passei à condição de arriscador total. Vou tentar sempre, se colar, colou. Pelo menos não carregarei para sempre a culpa da e pela omissão.

O jornalista Tarso de Castro, dizem, arriscou (tentou) e ganhou a atriz Candice Berge. Foi acertar ma mega-sena.  

Apesar de tudo, como o ser humano costuma ser tão parecido! Não é que me identifiquei com um grande escritor? Você noticia que:

“Erasmo escreveu (não sei sinceramente): ‘Quando tenho algum dinheiro, compro livros. Se ainda me sobrar algum, compro roupas e comida’.

Estou, mais ou menos, neste estágio. Mudei de apartamento, também, por causa deles, dos livros. Alguém já me disse que dia desses acordarei morto tal qual o “Zé das Medalhas”, aquele da novela Roque Santeiro, só que sufocado por livros! O que, admito, não seria de todo uma má morte (apesar de não desejar morrer nos próximos 3.000 anos), pois morreria coberto por cultura.

Sei não...

“E, para ser honesto, acho que fiz bem. Teria feito melhor se abandonasse esse hábito infame de adquirir livros como quem compra lugar no céu, desesperadamente, com avidez de amante. Por que não juntar dinheiro, por que não adquiri coisas sólidas e úteis? Depois, provido de certo capital, fundaria igreja e ficaria milionário. E ai, em vez de comprar, venderia lugares no céu. É o paroxismo do bom negócio. Poderia até escrever um manual ensinando como não comprar livros...”

De qualquer modo, ofereça o manual para o pessoal lá de casa, certamente alguém (ou todos) se arriscará(ão) a me dar um de presente. Embora eu, definitivamente, o recuse. Aceitarei por educação. Abri-lo, jamais.

Do Erasmo para o Felipe a identificação continua:

“Tenho poucas certezas. Uma delas, entretanto, é esta: meu lugar predileto são as livrarias. Como me sinto bem! Acho até que prefiro as livrarias às bibliotecas. Nessas, o peso do tempo me oprime, e me deixa um pouco triste. Nas livrarias não sinto isso. Também, é verdade, talvez não tenha tido grandes exemplos de bibliotecas, sendo talvez tola esta divisão”.

Também tenho a mesmíssima certeza. Só que meu caso é mais grave, gosto das novas e das velhas. Ou melhor, das novas e dos velhos! Explico-me:

Hoje conheço quase que todas as livrarias e sebos de São Paulo!

De Manaus todas e todos. Do Porto Alegre, de Florianópolis, de Curitiba (lá encontrei o Sebo do Osório, imagina só), do Rio de Janeiro, de Salvador, de Aracaju, Fortaleza, de Belém, de Boa Vista, de Rio Branco, conheço algumas e alguns. Ia esquecendo, de Belo Horizonte também conheço algumas.

Meus familiares se desesperavam quando nos aproximávamos de uma livraria e/ou sebo. Hoje, felizmente, o Juarez, meu herdeiro de 16 anos, até já me convida para “um livrinho”. O que invade meu peito de alegria, pois concluo que semeei em terra fértil.

Estamos no mesmo barco Felipe, também já me flagrei várias vezes lendo aquilo que pensei e não escrevi, mas que outro irmão de jornada captou perfeitamente.

“Deus, a originalidade não é deste mundo. Escrevi os parágrafos acima há uns meses. O que leio hoje? O velho Pessoa dizendo o que eu disse, antes de mim e melhor do que eu. Obviamente. Toma, Fernando, que a palavra é sua: ‘A literatura, como toda arte, é a confissão de que a vida não basta’. Satisfeito? E eu pensando que a terra era virgem. Vou ao silêncio. É o que me resta. O que não sei dizer é mais importante do que o que digo. Hein? Já escreveram isto também? Puxa, nem calado sou original”.

Não se importe com isso, ter seu pensamento escrito pelo ilustre poeta português é motivo de orgulho, mesmo ele tendo vindo a este mundo algumas decadazinhas antes de você. Mas não é para isso que existe a tal de metempsicose? Você talvez tenha pensado isso (o seu pensamento plagiado), em outra encarnação, anterior a qualquer outra do lusitano. Já é um consolo.

Discordo, discordo, discordo! Como pode dizer isso?

“E ai, quem sabe, voltarei a escrever em paz, errando muito e à vontade”.

Quem escreve não erra jamais!

Mesmo que o que se escreva não seja o melhor, serve de exemplo negativo, ou seja, para que o próprio autor ou outros, saibam o que não deve ser escrito. Tudo na vida tem a sua finalidade.

Em dezembro, presenteei minha sobrinha (de 6 anos) com uma coleção antiga (Mundo da criança). Como venho colecionando para minha filha (7 anos) uns fascículos chamados “Gênios”, publicados pelo OESP, os quais estavam juntos com a coleção, ela protestou: não queria livros velhos, queria livros novos como os da Maria Rosa. Foi demorado, mas consegui convencê-la que livros não envelhecem. Agora vem você e diz:

“- A literatura lida de uma forma admiravelmente boa com o tempo. Bons livros não envelhecem. Ganham, com os anos, nova cores. Ela é a única arte a superar, com folga, essa briga ingrata. Que nem chega a ser briga: porque o tempo é seu namorado e concede-lhe o que nega aos outros. A poesia recria o mundo a cada instante; e isso é mágico e poderoso.
Eu, satisfeito, concordei:
- Pois é. Às vezes, lendo um livro antigo, me pego pensando: puxa, lá atrás já se pensava assim...”

Será que lá na frente pensaremos assim?

“Que posso querer eu já não tenho? Pouca coisa. Não que tenha muito; é que tenho mais que mereço. Isso eu sei, mas às vezes esqueço. Vivo esquecendo as coisas boas que acontecem (tantas, Deus, tantas) e insisto em lembrar umas bobagens sem nenhuma importância, mas que atormentam o coração”.

É verdade, Felipe, por que que besteirinhas têm a capacidade de nos estragar o dia, mesmo quando ele foi pleno de realizações consistentes?

Você conhece o ditado: “as vezes engulo um boi, mas noutras, me entalo com um mosquito”? É desagradável, reconheço, mas diz muito a respeito dessa nossa capacidade de nos indignarmos diante de pequenas coisas.

Sempre penso na seguinte situação, para explicar essas bobagens que atormentam meu coração: costumo perder (contribuir) com R$ 50,00, mas não suporto a idéia de ser roubado em 10 centavos! Me peça, e eu, com certeza, não negarei, mas, por favor, não me roube.

As palavras do Manoel de Barros: “Tem mais presença em mim o que me falta”, demonstra que a perseguição da ausência é mais funesta que a abundância da presença. Costumamos valorizar apenas aquilo que não temos. Como devemos agir para fugir deste erro?

Isso é mal de mineiro?

“Admito que minha vizinha de cadeira (como você se chamava?) ajudava no meu amor pelas aulas. Namorávamos. Não, ela não sabia disso. Mas também, que apego idiota aos detalhes! O que importa é que fomos felizes um tempinho, depois brigamos, as coisas são assim”.

Na série JK, atualmente em cartaz, o Zé Maria Alkimin também namorava assim. Sua amada não sabia do namoro. Entretanto, como uma boa mineira, quando soube, aceitou! Isso é mal de mineira? Se for, já estou arrumando as malas.

Briga com o espelho!

Será que as pessoas brigam mesmo com o espelho?

Você diz:

“As pessoas costumam acreditar em espelhos. Eu prefiro acreditar em elogios”.

Eu sou mais modesto, acredito em ambos. Pena que ambos nem sempre concordem no ponto em que eu gostaria que fossem unânimes!

“Pensando bem, gosto dos espelhos. Eles, pelo menos, até hoje, nunca refletiram essa falta de rumo, essa alma de cabeça baixa, essas dúvidas bobas que guardo comigo. Sim, têm certa discrição. Melhor refletir um senhor, que não reconheço nem sei que é, do que refletir esses sonhos ingênuos, bobos sonhos de menino, coisa afinal ridícula para um senhor de ar grave”.

Mesmo incorrendo no grave erro de fazer “chover no molhado”, já que você o conhece tão bem, releia os “Versos de Natal” do Manuel Bandeira:

Espelho, amigo verdadeiro,
Tu refletes as minhas rugas,
Os meus cabelos brancos,
Os meus olhos míopes e cansados.
Espelho , amigo verdadeiro,
Mestre do realismo exato e minucioso,
Obrigado, obrigado!

Mas se fosses mágico,
Penetrarias até ao fundo desse homem triste,
Descobririas o menino que sustenta esse homem,
O menino que não quer morrer,
Que não morrerá senão comigo,
O menino que todos os anos na véspera de Natal
Pensa ainda em pôr os seus chinelinhos atrás da porta.

Será que o senhor de ar grave um dia matará o menino que trás dentro de si?

Eis sua resposta:

“Vocês desculpem a sinceridade, mas estou triste. Com esse parágrafo aí de cima. Não sei ser chamado de senhor, nem – confesso – por mim mesmo. Há um abismo entre a palavra e o que eu acho que sou. Não, eu não sou um senhor. Sou um menino, com alguns medos e muitas alegrias, disfarçado de gente séria para tocar a vida. Por favor, acreditem, é só um disfarce, acreditem porque também quero acreditar”.

Felipe: será que você só pensa naquilo?! Releia-se:

“Os eclipses são uma safadeza da natureza, deixam o dia escuro para a danação dos astros...”

Bem que a natureza deveria ser um pouco mais safada: os eclipses deveriam ser mais constante e mais demorados, permitindo, assim, a safadeza dos homens. E tem coisa melhor para se pensar?

Gostar é um verbo intransitivo ou transitivo? Direto ou indireto? Sei lá, nem me interessa saber. Já o outro tema...

“Gostar não é saber. Que fique bem claro. Por exemplo: gosto de mulheres mas pouco sei sobre elas. Mal comparando, é o que ocorre com a física.
Foi bom saber que a física quântica chegou ao princípio da incerteza. Obrigado, Heisenberg! Eu admito que fiquei mais confortável; eu e minhas incertezas. Vou por aqui ou por lá? Sei lá! Nem os elétrons sabem!”

Epicuro antecedeu há muito o Heisenberg quando propôs o “clinamen”, e já propunha o princípio da incerteza. Daí a igreja não vê-lo com bons olhos, já que para ele tudo depende do acaso. E onde fica Deus?
Deus fica para nos dar o bom gosto que você tem. E esse, sinceramente, não precisa ser explicado.

Há pouco tempo, descobri a fundamentação filosófica do uso das algemas. Agora, bom Felipe, você nos diz:

“O carnaval está filosoficamente fundamentado”.

Essa droga de filosofia está em tudo? Os donos do poder não dizem e incentivam que ela não serve para nada?

Fico com você, ou melhor, com o poder da sua pena.

Vamos às divergências?

Você pergunta:

“O leitor achava as curvas de tempo de Einstein mirabolantes?”

Eu, seu leitor, respondo: Sim, acho o Einstein um farsante.

Só eu?

Não. O time é bem maior. Acabo de comprar dois livros de autoria do Chrsitopher Jon Bjerknes:

- Anticipations of Einstein – in the General Theory of Relativity (398 páginas), e

- Albert Einstein – the incorrigible plagiarist (407 páginas).

(ambos com uma considerável bibliografia)

Como estão em inglês, preciso urgentemente de um tradutor. Será que o Felipe, quando diz: “venho a trabalho, mas um trabalho, digamos, levemente vagabundo, que não me ocupa nem as horas nem a mente”, não está se habilitando a ser este tradutor? Em caso positivo, responda para a caixa postal número tal.

Será que Hannah Arendt adotou a tal de “Cebola cósmica”, da qual você fala?

É que ela, ao falar sobre o poder, o compara a uma cebola, em cujo centro não tem nada. É oco. Mesmo assim, existe!

É isso mesmo, “matéria escura”?

“Matéria Escura. Ninguém sabe bem o que é isso, com certeza é alguém mal-encarado e sem documentos”.

E o politicamente correto? É apenas figura de linguagem.

Esta sua afirmativa:

“Cada um é dono dos buracos que tem. O que entra neles, só o proprietário pode dizer”.

Me fez lembrar a decisão da Justiça goiana: “...de bêbado não tem dono”. Lembra?

Já que não podemos enganar aos outros, enganemos a nós mesmos:

“É preciso que saibam que eu, como os bons vinhos, tenho melhorado; devia me dizer magnífico, mas não digo. Há aí uns leitores invejosos que não receberiam bem o adjetivo. Mas a verdade não é outra”.

Também penso assim, mas não só leitores, a realidade e suas “mãos de galinha” (mãos sim, já que para as mulheres é “pés”. E nós não somos o oposto delas?), insistem em dizer o contrário, ainda mais quando começa a fofocar com o tal de espelho.

Não vou mais falar sobre Einstein:

“A teoria da relatividade geral de Einstein (e a teoria das cordas, com a supergravidade) arma cama para viagens no tempo”.

Porém, você já prestou atenção no seguinte: ninguém que cita Einstein indica a fonte!

Onde ele disse isso ou aquilo? Mistéééério.

“...ela certamente parece permitir todas essas soluções exóticas sob as quais as viagens no tempo são teoricamente possíveis”.

Realmente, em teoria tudo é possível. Por exemplo: no Brasil, teoricamente, o Poder Judiciário funciona.

Quanto às viagens no tempo, em teoria, realmente, dizem ser possível. O grande problema: a fonte de energia para propulsionar o viajante ou sua aeronave. Onde encontrá-la?

“Isso quem diz não sou eu, é o senhor Einstein”.

Caro Felipe, como dizia aquela propaganda (“melhor rever seus conceitos”), ora parafraseada: melhor você rever seu orientador de física.

Já fiz o mesmo pedido:

“Pode vir, cruel tempo, pode me fazer velho. Não me faça, por favor, amargo ou azedo. Isso eu não quero ser; nem espero aprender”.

Mas se exemplos da rua... e de casa, valem, parece que essa é a regra geral: amargura e azedume. Nunca vi gente tão mal humorada. Gente com tanto tempo (aposentados) a reclamar dos atrasos!

“Goethe me alivia um pouco, lembrando que os melhores prazeres deste mundo não são completamente puros”

Hoje, como temos o querido colega Goethe Odilon Freitas de Abreu, precisas identificar qual o Goethe que está te aliviando um pouco. Sabe como é que é, todos podem dele (do aliviador) se socorrer.

Este, sim é o verdadeiro lema:

“Na dúvida, prefira o erro à omissão”.

Quem pensar diferente, e há quem pense, não pode ser MP.

Tens certeza desta afirmação?

“As melhores mulheres pertencem aos homens mais ousados”.

Ela é decorrente daquilo que acima disse Shakespeare, com quem eu concordo quanto a iniciativa, já quanto ao resultado...
 
Me julgo ousado, muito, inclusive. O simples fato de estar me dirigindo a um homem de pena leve, sábia, ferina e sensível já demonstra minha ousadia tamanha. Mas: onde está a minha cota nessa felicidade, já que não encontrei nem a pior, se é que nesse tema existe a pior, o que me recuso, terminantemente, a acreditar.  

Não seja modesto. Como pode um “rato de biblioteca” fazer uma pergunta como essa?

“Jorge Luis Borges? Ah, sei... Acho que já ouvi falar. Ele me diz que toda literatura, no fundo, é auto-biográfica”.

Sim, é ele mesmo, o imortal argentino. Aliás, o Borges enxergava longe!

Felipe, gostaria de ter o seu talento e poder decantar, com outras melodias, a cidade de São Paulo, como você bem faz com BH, e assim, dizer que, se a capital mineira tem ruas com nomes de Estados, São Paulo tem ruas com noves de Países! Aqui, não se admire, se ver a Groelândia cruzando com a Colômbia.

Com todo respeito e carinho, e como cada qual canta “sua” terra, como falou o Rossi em alguma de suas canções, penso que a Terra da Garoa (ou ex-Terra da Garoa, já que o calor está, atualmente, manauara) é mais sonora. Exemplo? SAMPA. É impossível, por exemplo: MIGE ou MINGE ou MINGER, não tem liga. Ou tem?

Finalizo, Felipe, feliz, fazendo força (acabou a língua do “f”) para não incorrer na assertiva:

“A mentira, essa magnífica vaselina social, continua fazendo carreira”.

É que não tem esta escrita nenhuma outra finalidade senão a de dizer: obrigado e parabéns pelo seu livro, Felipe Peixoto, foi com grande alegria que iniciei sua leitura, mas foi com maior satisfação que a encerrei. Não, obviamente, pelo fato de ter terminado, mas porque com ele aprendi e me deliciei muito com suas crônicas. A única recompensa que se pode querer quando se lê um livro, eu já a obtive: minha alma navegou, perdeu-se, encontrou-se: sobreviveu renovada à espera da sua próxima penada.

Quanto ao dinheiro que quero emprestado, falamos ao telefone.

Abraços,


Osório Barbosa

P.S.: Sobre o livro do Gabriel García Márquez, apesar de interessante, não consegue se ombrear ao seu, sem “vaselina social”. Falarei sobre ele quando estiver mais disposto.


PALAVRAS TROCADAS COM O AUTOR:

"Felipe Peixoto Netto" 01/30 8:54 pm

Amigo Osório (permita-me chamá-lo assim)

Apenas hoje, voltando de férias, li, imensamente surpreso, o seu e-mail. Olha, rapaz, fiquei sem palavras. Estou aqui entre inibido para agradecer e com vontade de reler o que você escreveu, e me divertir mais. Porque com sinceridade digo: achava que você leria o livro. Vejo que você fez muito mais: criou um diálogo sutil e divertidíssimo. Naturalmente coisa de escritor. Aliás, você que pertence à estirpe sabe: não há melhor modo de elogiar quem escreve. E foi isso, com sensibilidade e humor, que você fez. Obrigado, Onório, e espero ter tempo - e talento - para um dia escrever a tréplica.

Um grande abraço do Felipe (com medo até de atender telefone, já que não vou poder negar o empréstimo).

E,

"Osório Silva Barbosa Sobrinho" 01/30 10:53 pm

Caríssimo,

Talvez você não mereça o elogio, mas o autor do livro...
Brincadeirinha.
Seu livro está na "revista" da Livraria Cultura aqui de Sampa (e adjacências).
Posso colocar o que escrevi lá?
Abraços,
Osório

E,

"Felipe Peixoto Netto" 02/01 1:54 pm

Ora, Osório, claro que pode. Será uma grande, imensa honra. Já fiquei comovido com a generosa divulgação que você fez na nossa rede. Imagina ampliar isso para os leitores de SP (não procuradores). Ah, só para constar: já li o "nosso diálogo" umas boas vezes. E sempre rindo muito.

Grande abraço do Felipe

Você está aqui: Home | Livros | Livros que Li