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Aristóteles e a sua derrota para a sofística!

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Aristóteles e a sua derrota para a sofística!

 

Os sofistas vieram de afirmar que é impossível mentir, que tudo o que se disser é verdade!

 

Para contrapor os sofistas e estabelecer o primeiro princípio das ciências, Aristóteles propôs o princípio de não-contradição: uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo. Com tal princípio Aristóteles busca regular o discurso.

Os sofistas, quando afirmaram o acima, tinham em mira Parmênides (Aristóteles, creio, ainda não era nascido) que em seu Poema fixou que: “o ser é, o não ser não é”. “Que é impossível dizer o não-ser. Que apenas o ser pode ser dito”. “Que dizer (falar) e ser é a mesma coisa”.

Não devemos esquecer que para fundar a ciência do “ser” (chamada de ontologia), Parmênides usou, também e exatamente, a linguagem e não objetos materiais, digamos assim.

Os sofistas descobrem (dizem) que as coisas não existem, que apenas existe o dizer, o lógos, palavra grega com inúmeros significados, dentre eles, razão, falar, dizer, discurso etc. Afirmam que é o falar quem cria as coisas e não as coisas que criam o falar.

Aristóteles reage a isso acusando os sofistas de serem “plantas que falam”, que “falam pelo prazer de falar”. Que eles são tudo isso por não aceitarem o significado das coisas, que é o que permite o diálogo.

Para Aristóteles “... falar é, desde o capítulo 4 do livro Gama daMetafísica, "significar algo para si mesmo e para outrem" (1006a 21); ora, quer seja o locutor ou a palavra que signifique, para "significar" é preciso sempre, não apenas "significar algo" (ti), mas também "significar uma única coisa" (hen, 1006b 12s.): "pois não significar uma coisa única é não significar nada e, se as palavras não significam, destrói-se a possibilidade de dialogar uns com os outros e, na verdade, consigo mesmo" (ibid. 1006B 7-9)”, cita-o Barbara Cassin (Efeito sofístico, Siciliano, São Paulo, 1990, tradução de Ana Lúcia de Oliveira e Lúcia Cláudia Leão, p. 275).

Digo eu: Aristóteles pega o trem da linguagem andando! Ele usa o falar para explicar o falar (metalinguagem), e quando ele fala as coisas já têm sentido, sentido que já foi estabelecido anteriormente ao seu falar e ele não explica como foi procedido esse estabelecimento {significamento!] inicial! Assim, o sentido é fruto, também, de convenção!

Foram as pessoas que, pelo diálogo, estabeleceram que aquele pó branco ia se chamar sal. E, assim, aos que vieram depois foi ensinado que aquilo era sal.

Poder-se-ia, contudo, ter-se convencionado que o que hoje chamamos sal chamar-se-ia maçã, por exemplo, ou qualquer outro nome, e vice-versa.

Mas Aristóteles prestou um grande serviço à humanidade, que foi desbancar a tentativa de teoria platônica estabelecida no diálogo Crático [tetativa pois lá nada é concluído!], especialmente ao demonstrar que “existem mais coisas no mundo do que nomes a lhes serem atribuídos”, assim é o que ocorre com a palavra “manga”, por exemplo, que serve para designar inúmeras coisas tão diversas como o dia e a noite. Tanto o é que se usa “manga” para designar uma fruta e a parte do vestuário camisa por onde se enfia o braço e que protegem os ombros!

O que que manga fruta e manga de camisa têm em comum?

Nada, absolutamente nada, além do nome!

Ou seja, o nome é como uma placa que se afixa sobre a coisa e a ela se adere enquanto for interessante para o diálogo daqueles que a usam.

Na Amazônia brasileira temos o mamífero aquático chamado de boto. Dentre as espécies de botos temos o vermelho e o roxo (este é o tucuxi).

Por séculos os nativos sempre chamaram o boto vermelho de... “boto vermelho”!

Nos anos oitenta, o oceanógrafo Jacques Custeau foi fazer uma expedição à Amazônia e “afixou uma nova placa” no boto vermelho, na qual está escrito “boto cor-de-rosa”!

Em pouco tempo os próprios nativos passaram a denominar o animal de “boto cor-de-rosa”, sendo poucos os que resistem ao novo nome optando por aquele que até então vermelho era conhecido!

Portanto, voltando a Aristóteles, ele ficou num beco sem saída, pois não consegue explicar o “sentido” antes deste ter sido estabelecido, ou seja, ele não vai à época do “não-sentido”! Embora saiba que lá tinha diálogo!

Com isso não temos como não afirmar que o próprio diálogo é anterior ao sentido!

Assim, portanto, é que as coisas podem sim, ser e não ser ao mesmo tempo, sendo, portanto, impossível a mentira!

Barbara Cassin, cita Gilles Deleuze, em Pourparlers: "O que se chama de sentido de uma proposição (acrescento: ou de uma interpretação) é o interesse que ela apresenta. Não há outra definição do sentido, e isto é o mesmo que a novidade de uma proposição". E, um pouco mais além: "As noções de importância, de necessidade, de interesse são mil vezes mais determinantes que a noção de verdade. De modo algum porque as substituem, mas porque medem a verdade do que eu digo". (Efeito sofístico, Siciliano, São Paulo, 1990, tradução de Ana Lúcia de Oliveira e Lúcia Cláudia Leão, p. 9).

A sofística, especialmente com Protágoras, jamais almejou a verdade, que, afinal, passados alguns milênios, continua sendo um sonho e uma meta que cada vez se afasta mais de quem a busca. É ainda Barbara Cassin quem diz:

A outra frase, no outro extremo da cadeia temporal, é de Protágoras, ou antes, de Sócrates falando em nome de Protágoras na Apologia do Teeteto, para explicitar a doutrina do homem-medida. Não se trata de fazer passar do falso ao verdadeiro, pois nem se deve nem se pode sequer fazê-lo, mas, diz Protágoras: "Aquele que pensa sob o efeito de um estado penoso de sua alma coisas igualmente penosas, fazemos com que pense outras coisas, pensamentos que alguns, por falta de experiência, chamam de verdadeiros, mas que eu chamo de melhores uns que os outros, em nada mais verdadeiros" (167 b). Enfim, na história sofística da filosofia, ficaria explícito que o melhor, a performance, é a medida do verdadeiro. (Efeito sofístico, Siciliano, São Paulo, 1990, tradução de Ana Lúcia de Oliveira e Lúcia Cláudia Leão, p. 9).

Podemos asseverar com o sofista: nenhum pensamento é verdadeiro, apenas alguns são melhores que outros, melhora que sempre é passível de ocorrer.

Thomas Kuhn e a sua “A Estrutura das RevoluçõesCientíficas”, nas mais faz que dizer isso: um paradigma é sempre superado por outro melhor, não por outro verdadeiro, pois este é inalcançável!

Disseram mais, os sofistas! Disseram que sobre qualquer tema/assunto é possível construir-se dois discursos opostos (dissoi logoi, ou discursos duplos).

As colunas jornalísticas do tipo “Tendências e Debates”, onde sobre o mesmo assunto, dois especialistas apresentaram pontos de vistas opostos, é típico ensinamento deles (O Jornal Folha de São Paulo, por exemplo, tem uma tal coluna).

Os advogados, são os maiores representantes dos sofistas na atualidade (sobre qualquer causa põem-se em lados oposto dos defendendo teses opostas. Os discursos de uns são diametralmente opostos aos discursos dos outros, e isso nada mais é que exemplo dos “duplos discursos”.

Portanto, apresentar várias versões (discursos) sobre um determinado tema, mesmo que absolutamente opostas, em vez de prejudicar, melhor prepara o conhecimento daquele que vai decidir.

Assim, lutemos para que sempre sejamos bem informados, que possamos ver as coisas pelos seus mais diversos ângulos, por profissionais de todos os ramos que tenham algo a dizer sobre o assunto, só assim estaremos melhor preparados para decidir.

As audiências públicas não me deixam mentir!

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